Soube ontem: a exposição Erótica – os sentidos da arte, que passou pelo CCBB do Rio de Janeiro, não vem mais a Brasília.
Não sei se está todo mundo sabendo sobre a mostra, ou sobre a polêmica com relação a algumas das obras exibidas ali, então vamos lá: Erótica reúne peças de todos os tempos, de diferentes técnicas (pintura, escultura, fotografia, etc.), tendências e criadores. Uma delas, em especial, causou a ira do grupo católico conservador Opus Christi, que chegou a usar um mandado de segurança para retirar a obra da exposição. Ela se chama Desenhando com terços e mostra vários órgãos sexuais masculinos desenhados com o objeto usado nas orações dos católicos. A autoria é da artista plástica Márcia X (1959-2005), que dedicou os últimos anos da carreira a retratar o pênis – de todas as formas que conseguisse. No site dela dá para ver a obra.
Outra peça que deu o que falar foi o homem por trás de uma imagem de São Jorge, retratado por Alfredo Nicolaiewski. No final das contas, a obra também foi retirada da exposição. Foi combinado entre os artistas que eles não deixariam a mostra vir a Brasília caso as duas criações não fossem reintegradas. Sendo assim, nós do Planalto Central perdemos a oportunidade de ver obras instigantes e diferentes.
Vários artistas, como a fotógrafa Rosângela Rennó, condicionaram a cessâo de suas obras à reintegração de Desenhando com terços ao acervo da exposição. Como isso não aconteceu, Erótica não virá mais para cá. A exposição foi vista por aproximadamente 55 mil pessoas em São Paulo e por mais de 90 mil no Rio de Janeiro.
Todo esse imbróglio me faz pensar em um poder de veto importantíssimo que está em nós – e que não tem nada a ver com os mandados de segurança, nem com a figura do censor que existia durante os anos de ditadura militar. Esse poder é muito mais simples: se uma obra qualquer nos desagrada esteticamente ou filosoficamente, podemos simplesmente virar a cara e não vê-la. O programa de TV está ruim? É só mudar de canal. A música desagrada os ouvidos? Há milhares de outras estações para ouvir. A obra de arte ofende os valores? É só não olhar para ela, pois.
A organização religiosa enalteceu a democracia que a permitiu ser ouvida – e que levou para longe dos olhos de seus integrantes as peças consideradas blasfemas. E, enquanto isso, por causa de um grupo limitado de pessoas, milhares de outras tantas vão deixar de ter acesso a várias produções artísticas – poder ver uma obra de arte, analisá-la, gostar ou não dela, também é um direito.
Particularmente, acho que nenhuma das duas obras pode ser considerada uma criação extraordinária. Essa do terço… entendo que a Márcia X quis chocar – e há quem tenha visto algo interessantíssimo ou megarepulsivo no desenho. Em mim, ela estranhamente não provoca nada. Já para a do Nicolaiewsky, tenho duas palavras: é kitsch e é agressiva. Dá uma sensação de flagra que eu não gosto muito. É uma pessoa desconhecida, fazendo algo íntimo, não é para todo mundo ficar vendo, né? (Se a visse na exposição, com certeza passaria para o próximo quadro. Poder de veto é isso, gente!).
Não sei como foi a exposição nas outras cidades (alguém viu? Deixe um comentário), mas o ideal seria que o CCBB deixasse uma sala separada para essas obras mais controversas (já que o pessoal topou bancar todas as escolhas do curador). Pelo menos o do Rio e o de Brasília têm estrutura mais do que suficiente para isso. Aí, era só botar um superanúncio dizendo que aquelas peças poderiam ser consideradas ofensivas, etc., etc., e que a pessoa estaria naturalmente livre para vê-las ou não. E botar uma censura etária para a exposição inteira, né não?
Mas com mandado de segurança não deve dar para fazer muita coisa. E certamente o banco não quis nem pensar na possibilidade de perder vários correntistas por causa de duas criações artísticas – sim, houve quem ameaçasse cancelar as contas no BB por causa da exposição.
É uma pena. Uma grande pena.
(Viu as obras de arte? Quer deixar um comentário sobre elas? Fique à vontade!)
6 comentários:
oi, Mari
Eu vi mostra Erótica, no Centro Cultural Banco do Brasil em SP. Foi no ano passado e há desde desenhos até esculturas que nos faz pensar "naquilo". Risos. Uma loucura, minha amiga...
beijos e continue falando da arte, mesmo que na forma de órgãos "não-governamentais". risos.
"Se a visse na exposição, com certeza passaria para o próximo quadro. Poder de veto é isso, gente!".
Civilizadíssimo esse comentário,Mari Lee.O resto é mau humor, ou atraso.Abs.
Ofensas a gente sente quando lê, diariamente, as notícias dos jornais. Vergonha a gente sente sempre que assisti os mandos e desmando desse país em cadeia nacional. A exposição nem era tudo isso (vi aqui no Rio), mas ganhou proporções inesperadas até pelos artistas com esse pseudo-conservadorismo de quem parece que não enxerga a realidade do Brasil. O que são pênis diante da fome, da corrupção e da violência nossa de cada dia?
Texto chato, sobre um assunto chato e com uma diagramação chata. Fiquei com preguiça de ler.
Beijinhos ainda assim, porque o blog é de uma pessoa legal.
Querida amiga,
Entendo sua revolta. E exatamente por ter uma posição diferente de todos que postaram, resolvi deixar meu comentário.
Sim, você sabe, sou católica. Vou responder como tal, claro.
Acredito e concordo com você que a melhor opção é a auto-censura. Você não gosta, não vá. Sabe que não vai agradar, não perca o tempo, não olhe.
Mas se o objeto OFENDE uma pessoa que você ama? Como você reage? Se deixa mal a fama de uma amiga? Se usa mal a imagem da sua mãe?
Ofende, sim, e muito. E não me venham com relativismos. Não me digam que para a artista aquelas bolinhas não significavam nada.
Ela sabia que para os católicos havia uma importância, uma relação de fé, um valor sagrado (aliás que é o que sociedade não sabe mais admirar ou respeitar).
Meu ponto é o seguinte: a peça era ofensiva. Será que a arte pode ser livre para ser ofensiva a valores sagrados? Será que somos livres para ofender aos demais conscientemente?
Sempre aprendi que a liberdade termina quando começa a do outro.
E respeito, que tá tão na moda, é exatamente o que faltou neste caso.
Minha opinião é que as duas peças deveriam ser retiradas.
vi a exposição aqui em sp. a curadoria foi ruim. mas o puritanismo é ainda pior
Postar um comentário