sábado, fevereiro 28, 2009

Você está apaixonada?

Em homenagem às moças que entram no blog por meio deste post e em busca de uma cura para suas dúvidas existenciais.

Teste: "Estou apaixonada?"

1. Você pensa naquele cara:
a) Uma vez por dia, quando se dá conta de que a pessoa tem um número de telefone de que você está precisando. Ou quando lembra que ele tem um caderno supercompleto de onde você pode copiar a matéria da escola/faculdade. Ou quando pensa que seria bom ter ajuda para alguma tarefa do tipo estudar para a prova ou abrir um pote de conserva.
b) Três vezes por dia. Uma de manhã, outra à tarde e mais uma vez à noite.
c) Umas 10 vezes (ou mais). Uma quando acorda, outra quando liga o MP3 para tocar aquela canção que o rapaz adora, outra quando assiste ao Pica-Pau e vê qualquer coisa que faz lembrar do moço…

2. Quando você vê o mancebo no corredor da escola ou na copa do trabalho…
a) Você diz: “Oi!”.
b) Você diz: “Oi!”. E pensa que seria fera se você, do nada, o pegasse pela mão e desse aquele beijo.
c) Você diz: “Oi!”. No segundo seguinte, você o pega pela mão e tasca-lhe um beijaço.

3. Se você visse o homi num fim de semana, num local público, tipo um shopping, um bar ou uma boate, qual seria a sua reação mais provável?
a) Esconder-se atrás da pilastra mais próxima e ficar observando-o de longe.
b) Dar um “Olá” e aproveitar para cumprimentá-lo com beijinhos.
c) Dar um “Olá” seguido de um abraço compriiiiido e beijinhos. Claro que você também tentaria entabular um papo sobre o primeiro assunto que viesse à mente.

4. Que música a faz pensar no objeto de sua dúvida?
a) Bebe Água, Galinha, de Babau do Pandeiro, porque o moço é um pândego.
b) Coffee and TV, do Blur, porque ele faz o estilo roqueiro alternativo.
c) Qualquer uma de Portishead, Fiona Apple, Cat Power, Air ou de outros artistas/bandas que façam um som para namorar.

5. Você joga “amor real” usando o seu nome e o do jovem em questão:
a) O que é “amor real”?
b) Uma vez por semana, de preferência nos fins de semana, quando aumenta a probabilidade de encontrá-lo em algum lugar onde você possa cumprimentá-lo com beijinhos.
c) Uma vez por dia. Vou esperar o fim de semana para quê?

Ok, moças, vamos aos resultados.
Se você respondeu mais “a”, a maior probabilidade é que você esteja apenas gostandinho dele, não?
Se você respondeu mais “b”, provavelmente você está apaixonada, né?
Se você respondeu mais “c”, então talvez você esteja com os 16 pneus e o estepe arriados por ele, certo?
Er-ra-do.

Se você se deu ao trabalho de fazer uma pesquisa no Google, chegar a este blog e fazer o teste até o final, há 100% de chances de você estar muito, m-u-i-t-o a fim do cara.

O que você vai fazer (ou não) com essa informação? Só você pode saber. Mas algo me diz que, se o rapaz não tem nenhum impedimento, esconder-se atrás da pilastra não é exatamente uma opção válida.

Pronto, falei.

Update! Fiz um texto com mais pistas para acabar com os dilemas das moçoilas. :o)
Acesse-o aqui.

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Ajudinha

(Já tinha postado aqui, mas resolvi fazer uma atualização)

Ao googlenauta que já passou por aqui três vezes tentando saber onde é o restaurante Astrid y Gastón, um programa imperdível para quem vai a Lima, no Peru:

O site é este.
O endereço é Calle Cantuarias 175, Miraflores. Tel.: 242-4422, 242-5387 ou 242 5723.
Horário de funcionamento: de segunda a sábado, das 12h30 às 15h30 e das 19h30 à 0h.

Quer mais uma dica? Ligue reservando. Eu resolvi ir na louca e só consegui jantar porque a hostess foi gente fina e ofereceu a última mesa na área do bar (decorada por poltronas lindas e onde se serve tudo do cardápio). Sério: as pessoas que chegaram depois só conseguiram o balcão, onde o cardápio é mais restrito.

E se eu não entender as coisas do cardápio? Normal, normal, normalíssimo. Acontece porque vários dos ingredientes estão em línguas que não são o espanhol (tipo quéchua). Como o serviço é bacana, fique à vontade para perguntar.

Finalmente, se tiver de apostar em um programa gastronômico, mesmo que ele custe mais, aposte neste. E não se preocupe com calorias. Mesmo os artigos considerados de luxo no Peru são bem mais baratos do que no Brasil. A comida é maravilhosa. E, afinal, é uma experiência para ter uma vez na vida. Portanto, se puder, faça da jaca a sua pantufa. Peça entrada, prato principal e sobremesa. Boa sorte!

O tapume mais legal

Na comercial da 702 Norte, próximo ao Colégio Militar de Brasília e a uma ruazinha cheia de oficinas mecânicas, achei esse tapume fantástico. Pelo que pude ler nas pinturas mais antigas do muro, o terreno cercado por ele havia sido antigamente uma oficina também. Só que a loja fechou, ninguém mais fez nada ali e o mato tomou conta.

Pelo menos os pichadores e propagandistas demonstraram algum respeito ao lugar. Acredito que seja por causa das pinturas e dos grafites feitos no tapume. Vejamos:


O traço me faz lembrar do Keith Haring e também do trabalho dos brasilienses Gabriel Góes e Caio Gomez, que bebem direto na fonte da arte pop.
Antes que caísse uma chuva absurda, ainda tive tempo de fotografar mais coisas feitas em estilos totalmente diferentes.

O careca pode ter sido o dono da oficina. Mas se parece com o Ciro Gomes também.

Também vi um elefante psicodélico...


... uma favela estilizada...

...E uma índia contemplativa. Algo me diz que quem trabalhou nesse tapume se divertiu à beça.





quinta-feira, fevereiro 26, 2009

Moça

Esses dias, vi que uma moça se exibia muito à vontade numa passagem para carros no finalzinho da Asa Norte.


Nova, bonita, mas com jeito meio antigo. Tipo uma pin-up.



Voltei esses dias para ver se conseguia fotografá-la. E consegui. Ela não se alterou nem um pouco.


Ei-la, meus caros leitores.





Um belo espécime feito em stencil grafite. Reparem como o concreto quase racha à esquerda e ainda assim ela mantém o carão.

Consegui chegar mais perto para fotografar em outro ângulo.


Em frente a ela, há uma companheira. Mas essa é mais discreta. Não tem nem rosto.


O artista podia ter ido ainda mais fundo e pintado sobre toda a propaganda eleitoral. Teria ficado fantástico.

Para ver as duas moçoilas, pare na comercial da 316 Norte e suba a pé em direção à 116. E cuidado com os carros!

quarta-feira, fevereiro 25, 2009

Novo Amor



Composição de Edu Krieger interpretada por Roberta Sá e Hamilton de Holanda. Gostaria de colocar a canção original, gravada pelo próprio compositor, mas o vídeo era ruim. E a versão da Maria Rita todo mundo já ouviu. Então, fico com essa, que tem um clipe bacana. Queira ou não queira, terminou o carnaval. :-)

terça-feira, fevereiro 24, 2009

Listinha de carnaval


Vi isso no Ah! Libanesa! e resolvi criar uma igual para eu refrescar a memória. Quem empolgar de fazer também me avise nos comentários. ;-)
A imagem, claro, é do superarquivo da Life. Que descoberta boa.

1. Oito séries de TV a que eu assisto:
- Sex and The City
- Law and Order — Special Victims Unit
- Os Simpsons conta como série de tevê???
Eu mal assisto tevê. Não consigo preencher até o número oito.

2. Oito restaurantes preferidos:

- Astrid y Gastón — Lima, Peru. São dois ambientes — um com mesas convencionais e outro com cara de bar, com sofazinhos fofos, onde todos os pratos do cardápio são servidos normalmente. Serviço perfeito. Tem ceviches mil e costelinhas de porquinho-da-índia, acompanhadas de pimentão recheado com quinoa. E as sobremesas são um arraso.
- Sumaq Misky — Cusco, Peru. Passei cinco dias lá. Gostei tanto do Sumaq que fui duas vezes e teria ido até mais. Por que? Pense num filé de alpaca bem temperado, acompanhado com quinoa preparada como um risoto. É bom, bom pra caramba. Bem simples, preço bom e serviço simpático.
- Eh — Recife, Brasil. Fui num compromisso de trab e nunca mais esqueci o menu degustação muito doido servido pelo chef Douglas Van Der Ley, uma figuraça.
Jardins du Saint Germain, Paris (Rue Dragon, 13) — Menu de almoço por 13 euros (entrada + prato principal ou prato + sobremesa) com terrine e pato confitado superiloveyou. Ou melhor, superjet’aime.
- Mangai — Brasília/João Pessoa/Natal, Brasil. Bufezão de comida nordestina (café e almoço) maravilhoso. E o pãozinho de mandioca???? Amo.
- Tábua de Carne — João Pessoa/Natal, Brasil. Carne-de-sol bem feita, sem mistérios, com um pirão de queijo que não existe em mais nenhum lugar do mundo.
- Fogo de Chão — em um milhão de endereços por todo o mundo. O que é aquela paleta de cordeiro? Sensacional. Se bem que churrascarias, para mim, têm funcionado muito melhor na fantasia do que na vida real. É comida demais.
- Qualquer um com comida árabe. Sério, não achei nenhum até hoje que não fosse superlegal.
Por que quase não falei de Brasília? Porque… porque não, ora. Não quer dizer que a cidade não tenha boas opções.

3. Oito coisas que aconteceram hoje:
- Acordei (dãããã).
- Apresentei mother ao delicioso chá verde gelado que compramos lá em casa.
- Devolvi Cidadão Kane à locadora.
- Vim trabalhar.
- Terminei um texto.
- Ouvi apuração de desfile de escolas de samba paulistanas na tevê do trab.
- Li meme de carnaval no blog da libanesa.
- Escrevi meu próprio meme.

4. Oito coisas pelas quais mal posso esperar:
- Que o carnaval acabe.
- Que E. chegue de viagem.
- Que a maratona de amanhã corra bem e rápido
- Que o meu plantão de fim de semana passe.
- Que a minha semana de folga chegue logo.
- Que maio chegue logo.
- Uh… acho que é só. Não estou tão ansiosa assim.

5. Oito coisas que eu quero.
- Emagrecer.
- Uma cor de pele nova, um pouco mais escura, talvez.
- Conseguir comprar um jeans em algum momento da vida.
- Afogar meu blazer preto e todas as minhas camisas de botão e ir para a praia.
- Que mais gente comente no meu blog (blogueiro é uma raça carente).
- Conhecer todos os lugares do mundo que eu conseguir.
- Estar bem longe do Brasil, de preferência em algum lugar que não valorize futebol, durante todas as copas do mundo em que eu viver.
- Aprender a falar francês direito.

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

Pedido

Que acabe o carnaval, por favorrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr.

Sete semanas - 3

O bebê não soltou um gemido sequer na primeira madrugada de vida. Ainda assim, Rosa não pregou o olho. Não conseguiu pensar imediatamente numa reação. O que fazer quando o anormal está perto assim, aninhado no peito, não é algo que se encontre num livro qualquer sobre maternidade.

Num primeiro momento, decidiu que usaria as mantas e touquinhas para esconder o detalhe enquanto mãe, avó e médico estivessem ali. Mas a medida não adiantou por muito tempo.

— O cordão já caiu? — perguntou a mãe, depois de alguns dias.
— Já — respondeu a garota.
— Vamos dar banho nele, então — sugeriu dona Carolina.
— Pode deixar, eu faço isso.
— Não vai me deixar ficar perto do meu neto?
— Você está perto do seu neto. Deixa que eu faço isso, por favor. Eu decorei o livro para mães — pediu Rosa, pegando o bebê apressadamente.
— Por que você não quer deixar?
— Porque eu não quero, porque eu entendi que você não estava disponível para cuidados, porque eu consigo dar conta da tarefa, por tudo isso.
— Você está sendo injusta com a sua mãe.

Maria Rosa deu as costas e trancou-se com Paulo no banheiro. Já tinha canecas com água morna preparadas perto da banheira. Despejou-as uma a uma. Tirou as roupas do bebê. Pensou em Julinho.

Não queria ver o detalhe que distinguia seu bebê dos outros. Mas era inevitável. Aos poucos, começou a observá-lo. Perdeu o medo e o nojo — assim como quando alguém descobre que o sangue é apenas algo que está dentro de si.

Quando começava a sentir compaixão pelo recém-nascido, ouviu baterem na porta do banheiro.

— Posso entrar? — pediu a mãe.
— Já falei que não quero ninguém aqui — devolveu.
— Deixa a sua mãe entrar, minha filha — insistiu a avó.
— Rosa, por favor — continuou dona Carolina.

A moça tirou o bebê da água, enrolou-o na toalha e abriu a porta, seríssima.

— Não quero escândalo, por favor — e demorou-se ao tirar o capuz da toalha.

A mãe pôs uma das mãos na boca e virou-se, de tanto susto. Sentiu as pernas amolecerem. Foi amparada por vó Constança e pelo médico.

— Cubra esse negócio — mandou o doutor.
— Não é negócio, é meu filho. Eu avisei que não queria vocês aqui.
— Vamos chamar o padre, minha filha — sugeriu a avó.
— Padre para quê? Para juntar gente aqui em casa? É isso que vocês querem? Jovem grávida, de 16 anos, dá à luz bebê de chifres. As pessoas chegam aqui em casa, vocês organizam fila e cobram entrada. Não sabia que vocês eram tão desprendidos com as aparências — retrucou a menina.

A criança começou a grunhir.

— Preciso ir embora. Mãe, vamos — disse Carolina, num começo de choro.
— É o melhor que vocês fazem — desabafou Rosa, fechando a porta de novo e devolvendo o bebê à água.

Estranhamente, os dias seguintes foram tão calmos quanto podem ser os dias de uma mãe cujo filho está longe de ser um bebê de propaganda. Paulo dava pouco trabalho. Dormia a noite inteira. Mamava nas horas certas. Rosa nem precisava falar muito com Dalva, muito menos com o caseiro, José — eles ficaram ali por pura piedade.

Rosa cuidava do filho e esperava por Julinho. Numa carta recente, ele prometera que viria buscá-la.

Numa noite, a jovem mãe fechou as janelas e verificou se as portas da casa estavam trancadas. Por isso mesmo, morreu de susto quando viu que o bebê não estava mais no berço.

— Dalva, José, cadê meu filho? — gritou, enquanto chamava os empregados.
— Como assim, dona Rosa, seu filho não está com você? — estranhou Dalva.
— Se não está com nenhum dos dois, foi levado daqui — concluiu a moça.
— Eu vou à cidade avisar a polícia. Não se leva uma criança assim — disse José.
— Calma, minha filha — pediu a empregada, enquanto ajudava a moça a sentar-se na sala.

Meia hora depois, a campainha tocou. Não era José.

— Quem é o senhor? — quis saber Dalva.
— Pode abrir, Dalva. É o Julinho — avisou Rosa.
— Cadê a mãe mais linda? — perguntou ele, afastando os cabelos da moça e descobrindo o rosto vermelho de choro.
— Levaram nosso filho — ela respondeu, abraçando-o.

Sem soltar Rosa do abraço, Júlio pediu licença à Dalva e levou a namorada para quarto. Trancou a porta.

— O que eu vou fazer agora? A polícia vai vir aqui e descobrir a minha história. Vou ter de ir embora daqui. Não vou ter paz nunca mais — lamentou a moça.
— Shhhhhhhh. Não fala assim. Minha tia morreu e eu vim buscar você. Nosso filho já está comigo.
— Onde está o Paulinho?
— Num lugar muito melhor que este — garantiu, antes de tomá-la pela última vez neste mundo.

Quando a polícia chegou, os empregados da casa não encontraram mais os jovens. Dalva e José só não foram presos porque o delegado temia demais as coisas do sobrenatural.

O policial que o acompanhava encarregou-se de tentar espalhar a lenda na cidade de Corumbá. Não conseguiu. A história metia muito medo na gente simples do lugar.

A família Camargo nunca mais voltou à casa nem tocou no assunto.


Essa é uma história totalmente de ficção, motivada pelas inúmeras pesquisas Google sobre o bebê de Corumbá.

Leia os textos anteriores: parte 1parte 2.

domingo, fevereiro 22, 2009

Sete semanas - 2

Queridos leitores, segue abaixo a continuação de Sete semanas, que comecei a escrever no post abaixo. Beijos.

Nas semanas seguintes, o mau humor fez menção de ir embora. Primeiro, a carta que Julinho mandou de Belo Horizonte apareceu na caixa de correspondência. Falava dos bailes aonde Maria Rosa teria adorado ir, das primeiras aulas no curso de farmácia e, mais importante, das condições de saúde da tia, que haviam se tornado ruins nos últimos tempos. A garota sorriu e mordeu os lábios de satisfação ao imaginar que poderia retomar os sonhos de casamento e fuga com o jovem tão logo a velha batesse as botas.

Depois, surgiram as primeiras flores das roseiras do jardim.

Finalmente, a mãe e a avó apareceram na casa, junto com o motorista e o médico da família — que veio saber da evolução da gravidez e descansar por uns dias. Pelo menos agora, Maria Rosa teria mais gente com quem conversar sobre assuntos que não fossem somente o tempo e as coisas da casa. Também teria renovado o estoque de revistas, livros e discos.

Por meio de vó Constança, a garota soube que o pai continuava raivoso. E que os irmãos menores perguntavam por ela um dia sim e o outro também. Queriam saber por que eles, que também estavam na escola, não podiam tirar férias grandes como as da irmã.

Algumas noites depois, a casa foi acordada com um grito. Mãe, avó, médico e empregada se levantaram correndo para ver o que tinha acontecido no quarto da moça. Encontraram-na se debatendo na cama, parecendo ter um começo de convulsão e uma dor ancestral.

O doutor fez exames para saber se seria necessário, àquela hora da madrugada, pegar o carro e seguir para o hospital mais próximo dali — ideia que assustava dona Carolina. O estranho é que, aparentemente, nada de errado havia acontecido. O feto estava onde deveria estar. Tampouco havia sangue nas roupas e nos lençóis. O jeito foi administrar alguns analgésicos.

Dois dias depois, dona Carolina quis saber se o ataque da filha havia sido uma invenção.

— A dor que eu senti foi real. Não teria por que criar algo tão grave — retrucou a moça.

Por via das dúvidas, o médico receitou repouso durante o máximo de tempo possível nos meses finais da gravidez. E foi aí que jovem nunca mais teve paz.

Deitada durante quase todo o tempo, Maria Rosa desenvolveu olheiras. De tão irritada, passou a comer por pura questão de sobrevivência. Parou de conversar também: lia e relia revistas e livros até que as bordas do papel começassem a desgastar. Escrevia cartas incompletas de amor, que eram enviadas a Julinho do jeito que estivessem.

Dalva, a empregada, achou prudente afastar da moça as agulhas de costura.

Quando a mãe, a avó e o médico voltavam a Corumbá para ver como a saúde estava e trazer-lhe o enxoval da futura criança, as coisas melhoravam um pouco. Mas a falta de apetite e a solidão acompanharam Maria Rosa até a data do nascimento do bebê.

Paulo nasceu num fim de tarde de um dia quente e abafado. O parto foi rápido, sem muito choro por parte de mãe e filho. Na superfície, o bebê parecia bem. Sinais vitais normais, pele sem manchas. O cabelo era espesso para um recém-nascido.

Paulo foi entregue a Maria Rosa. Ela tomou-o nos braços e começou a acariciar seus cabelos com os dedos. Mexia nos fios como se quisesse achar entre eles o amor que deveria sentir pelo filho.

Ao invés disso, encontrou duas pequenas protuberâncias pontudas. Mas não quis dizer a ninguém.

Naquela noite, depois que todos já haviam ido dormir, pegou uma tesoura e delicadamente cortou os cabelos do bebê. E verificou o que já desconfiara: eram chifres.

Continua: parte 1parte 3.

sábado, fevereiro 21, 2009

Sete semanas

Num tempo não muito distante, há uns 60 anos, as moças más (leia-se: solteiras e grávidas, porém de famílias tradicionais) eram mandadas para lugares isolados no interior para viverem a gestação sem macular o nome de seus pais.

Maria Rosa, 16 anos, era uma dessas moças. Não resistiu. Quando conheceu Júlio — ou melhor, Julinho —, dois anos mais velho do que ela, num baile promovido pelo clube que ambos frequentavam, não suportou apenas o protocolar namoro de mãos dadas. Tinha o consentimento dos pais para namorar, mas precisou encontrar suas formas de entregar o rosto, os lábios e a virgindade nos cinco meses que se seguiram desde a festa.

Embora não parecesse, esse Julinho era diabólico.

A moça sabia que algo só podia estar muito, muito errado quando, numa noite, pôs para fora todo o requeijão da roça que havia comido no lanche — e que comia desde pequena. Seu desconforto mensal estava atrasado havia semanas. Conseguiu às escondidas uma consulta num ginecologista que atendia num bairro afastado do centro de Belo Horizonte. O médico acabou confirmando a gravidez: sete semanas.

A notícia chegou aos pais numa carta escrita em meio a lágrimas durante o recreio da escola. Foi um escândalo, é claro. Os avôs e a avó paterna, se estivessem vivos, teriam um ataque. O pai, que alternava seus dias entre a capital e as muitas fazendas e casas de descanso da família, trancou os filhos menores no quarto e só não encheu Maria Rosa de sopapos porque a mãe, Carolina, não deixou. Preferiu ela mesma dar umas sacudidas na garota. A avó materna, dona Constança, chorou baixinho numa das poltronas de canto da sala de visitas.

— Maldição, maldição — repetia a senhora.

A família resolveu mandar Maria Rosa para longe dali, no interior de Goiás. Os Camargos tinham uma bela residência colonial de férias na cidade de Corumbá. Próxima ao rio e distante do centro, a casa parecia um lugar apropriado para esconder a dona de uma barriga que começou a inchar rapidamente. O caseiro que já trabalhava ali ganhou a companhia de uma das empregadas do clã, que saiu de BH para atender a garota no que ela precisasse.

Mãe e avó iriam visitá-la a cada mês. O pai, por sua vez, ficou tão desgostoso que resolveu: a partir dali, a filha mais velha e uma mula qualquer da fazenda tinham o mesmo significado.

Julinho, que tinha os pais falecidos e morava com uma tia rica, não quis saber de casamento (a bruxa não permitiu; não queria perder os favores sexuais do rapaz). E, para não descobrir o quanto doíam os tabefes de Anselmo Camargo, aceitou dar o próprio sobrenome ao filho que teria com a moça. Num bilhete secreto, porém, prometeu à namoradinha que lhe escreveria cartas para acompanhar a evolução do bebê.

Maria Rosa estranhou a vida solitária na casa de Corumbá. Um humor quase suicida tomou conta do corpo. Em pouco tempo, passou a odiar os preciosos livros que havia levado, as ferramentas de bordado e costura que lhe eram tão caras e, sobretudo, a curiosidade de quem vivia perto dali e espiava sua barriga com interesse. Num desses dias de mexerico, atendeu a porta e recebeu uma vizinha que veio visitá-la a pretexto de oferecer-lhe um bolo de fubá.

- Muito grata pelo bolo — disse ela, esforçando-se para fazer uma cara agradável.
- Com quanto tempo você já está? — quis saber a senhora.
- Cinco meses — Maria Rosa murmurou.
- E o pai, não vem te visitar?
- É para isso que você veio aqui, então, sua medíocre? — explodiu, empurrando de volta a travessa de bolos para a vizinha — Ele virá sim, virá para me tirar dessa cidade horrorosa, me afastar de gente inferior como você. Saia! — ordenou, batendo a porta.

Encostou-se na porta e agachou respirando fundo, com raiva. Dalva, a empregada, veio correndo com um copo de água com açúcar na mão. Levou a garota para a varanda em frente ao rio. Maria Rosa tomou o líquido e passou o resto do dia lá, onde havia deixado os materiais de costura. Até a noite chegar, olhou para o rio e permaneceu em silêncio, espetando os dedos com as agulhas.

Continua: parte 2, parte 3.


sexta-feira, fevereiro 20, 2009

Taciana

Todos os dias, quando dá 17h45, Taciana e o segurança do prédio público onde ela trabalha como recepcionista fecham a entrada para os visitantes que chegam.

Às 17h50, ela para de atender o telefone.

Às 17h55, desliga o computador.

Às 17h57, vai ao banheiro fazer xixi, lavar as mãos, trocar de roupa e passar batom.

Às 18h, sai do trabalho, pega o ônibus e vai lépida e fagueira para a faculdade.

Hoje, como era sexta-feira de carnaval e quase ninguém trabalhou, também resolveram liberar recepcionistas, seguranças e copeiros mais cedo. Aí, o ritual de Taciana mudou um pouco.

Às 15h30, fecharam a entrada para o público. Ninguém vai lá na sexta-feira de carnaval mesmo.

Às 15h40, ela decidiu que não iria mais atender ao telefone. Nem precisava: ninguém ligou mais.

Às 15h43, ela foi ouvir piadas novas contadas pelos meninos da copa do térreo. Saiu de lá com um Sonho de Valsa que sobrou do lanche dos estagiários.

Às 15h52, voltou para desligar o computador. Demorou tanto para isso acontecer que Taciana chegou a pensar que a máquina estivesse de sabotagem com ela.

Às 15h58, foi ao banheiro trocar de roupa e dar aquela enrolada básica.

Às 16h, pegou a bolsa e saiu caminhando pela calçada feita de pedra portuguesa e cheia de falhas. Os saltinhos faziam toc-toc-toc-toc de tanta felicidade. Tinha saído mais cedo e nem ia precisar ir para a faculdade. Quando o carnaval chega, ninguém quer saber de assistir aula.

Pegou o primeiro ônibus rumo à rodoviária do Plano Piloto.

Quando chegou lá, entrou na fila do ônibus que a levaria para casa, abriu a bolsa e pegou o vale-transporte, o tocador de MP3 e o Sonho de Valsa.

Sentou-se em uma das cadeiras mais altas do ônibus, as suas preferidas. Abriu o bombom, colocou os fones de ouvido, encostou a cabeça na janela e deu uma banana mental para o mundo — afinal, é carnaval. Seguiu sonhando até Taguatinga.

Taciana não pula em blocos. Não é madrinha de bateria. Na verdade, nem gosta da festa em si. Mas adora a doce sensação de inutilidade coletiva que toma conta do país quando o carnaval chega. Ela sabe: até a quarta-feira chegar, a vida vai ser outra história.

quinta-feira, fevereiro 19, 2009

Prêmio Dardos

Numa noite estrelada, numa praia não muito longe de Luanda, o conselho de sábios do blog Diário da África fez um encontro extraordinário para tratar de um assunto urgente: a concessão do Prêmio Dardos a uma blogueira nas distantes terras do cerrado brasiliense.

Reunidos em volta de um laptop conectado a um excelente telemóvel da Unitel, eles confabularam, mediram, pesaram e decidiram quando a manhã se aproximava: é agora!


Para comemorar a decisão, encheram a cara de cerveja Cuca e adoraram as palancas negras. Quando tudo acabou, o grupo (em meio a uma ressaca espetacular) me enviou o seguinte texto por e-mail.


"Com o Prémio Dardos reconhecem-se os valores que cada blogger emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc. que, em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras. Esses selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre os bloggers, uma forma de demonstrar carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web.
Este prémio obedece a algumas regras:

1) Exibir a imagem do selo;

2) Linkar o blog pelo qual se recebeu a indicação;

3) Escolher outros blogs a quem entregar o Prémio Dardos."

Nesse momento, diante do meu computador, fiz uma reverência silenciosa.

Como não sou de contrariar sábios adoradores de palancas negras, anuncio abaixo os próximos atingidos por alguns dardos:

* Aéreo Porto

* Blog do Quemel

* Maior, melhor, mais rápida

* Totalmente Sem-Noção

Momento Ofélia 2


Finalmente teremos a parte 2 da superaula de temperos que fiz no fim de semana e resolvi compartilhar porque foi: 1) Legal; 2) Grátis. Se eu tivesse temperos em casa (a comida acabou toda porque insisto em comê-la; preciso fazer compras), eu faria fotos e colocaria aqui. Mas... paciência. Na falta de tudo isso, vou de imagem de arquivo da Life, produzida em Cape Cod, nos Estados Unidos, em 1953.

Vamos lá.

Arroz
Não precisa ser lavado! Perde todas as propriedades nutritivas. Principalmente o arroz branco, que já é todo refinado.

Hortelã
É um dos principais temperos da culinária árabe. Combina muito bem com beringela.

Cúrcuma
Às vezes, vende-se erroneamente como açafrão. A diferença entre os dois é que o açafrão é muito mais intenso (em cor e sabor) e caríssimo, já que é necessário usar um milhão de flores (estou chutando o número) para obter o pozinho (o pistilo da flor). Usa-se na galinhada e para dar cor ao arroz.

Molho inglês x Shoyu
Um não tem nada a ver com o outro e não pode substituir um ao outro. O primeiro é mais ácido, tanto que pode ser usado quando faltar o vinagre. O segundo, por sua vez, é supersalgado, portanto, moderação nele! O molhinho de soja fica bem com carne de porco e peixes.

Pimenta calabresa
Ótima para temperar carne de panela e carnes assadas. Dica: ou se usa calabresa, ou pimenta-do-reino ou cominho. Não bote os três na mesma receita, ou sairá fogo pelas suas ventas. Não fui eu que inventei isso, foi a professora.

Alecrim (amo!)
Fica bom com quase tudo: frango, porco, cordeiro e peixes assados (como o tambaqui). Dica: quando assar no preparo de carne, usar o galho em si ou partes dele (não tirar as folhinhas). Quando o prato ficar pronto, retire-o. Do contrário, o gosto ficará forte demais.

Manjericão
Além de deixar as massas gostosas, fica bem em pratos com espinafre. Também pode ser colocado na barriga dos peixes assados inteiros. Parece que dá certo. :-)

Tomilho
É o principal tempero do coq au vin (além do vinho, claro!). Tempera verduras e cordeiro maravilhosamente.

Aipo / salsão
Não sei por que não anotei nada sobre esses dois. :-(

Alho (eca)
Se tiver de fazer alguma fritura com o ingrediente (eca), tipo frango à passarinho, não use o alho puro (eca). Prefira o molho pronto de alho (eca, eca). Do contrário, a fritura queima. Nunca deve ser usado em comidas leves, como arroz branco, peixe, verduras, etc. Em frango de granja, jamais (no caipira, pode). Ao fritá-lo, ele deve ficar com cor parecida à do doce de leite, e não esbranquiçado. Não use Arisco Alho e Sal, a comida fica horrível. Se é para usar alho, se você não tiver nenhuma outra alternativa (haha), que seja o comum.

Estragão
Não sei muito sobre ele... só que se deve usar em pequena quantidade. :-P

Fondor x Grill
São temperos prontos para carnes. O fondor se usa para as brancas; o grill, para as vermelhas.

Mostarda
Pode dar um gosto totalmente diferente à comida, a depender da variedade. A marrom vai para os sanduíches. A mostarda em grão, para os bifes e para alguns molhos. A amarela também é usada em molhos e para dar cor à carne de frango (para tanto, deve ser pincelada).

Salsa x coentro
Aprender a diferença entre os dois (além da olfativa, claro) foi o melhor. Agora sei distinguir salsa daquele outro ingrediente que, como alho, também deveria ser interditado para consumo humano (hahahaha). A salsa tem folha bem maior. Tempera bem carnes vermelhas e molhos para salada. O coentro tem folha menor e mais mole. Em quantidade microscópica (e não a usada por aí, para temperar cenoura ralada em restaurante self-service), dá um toque a frango, peixes e alguns pratos com frutos do mar, como casquinha de siri e moquecas.

É isso, minha gente. Algum dia, pretendo ainda fazer um post parte 3, final, porque ainda há dicas legais de preparação de carnes. :-)

Agora vou almoçar. A julgar pela hora, nada mais adequado, não?



quarta-feira, fevereiro 18, 2009

Flashback

Remedy, com o grupo Black Crowes. Porque a música é ótima, porque o vocalista dança de um jeito muito doido e porque acho que não vou conseguir escrever hoje...

terça-feira, fevereiro 17, 2009

Tradução!

Atendendo a pedidos, coloco abaixo a tradução do poema do post aí de baixo... :o)

Estou ferrada.
Ao longo dos últimos três dias, tentei achar uma definição para o amor
E agora estou ferrada.
Procurei no meu coração por palavras fortes,
Frases precisas e versos nobres,
Mas tudo o que achei foram conceitos cafonas.

O que devo fazer?
Será que fujo?
Será que deixo de entregar meu dever de casa de inglês
À professora, que acreditou em mim
E cuidadosamente escolheu o tema
Para a minha redação semanal?
Não. Seria ignóbil da minha parte.

Ao invés de desistir, vou buscar o que ainda está mais fundo em mim,
Revolver até encontrar o abissal, o imensurável,
Vou cavar e suar e sangrar, se necessário,
Até encontrar a resposta.

Peraí, acho que encontrei algo.
Parece uma fita de DNA.
Na verdade, é uma fita de DNA.
Vamos olhar mais de perto?

Eu me reconheço em cada alelo.
Veja só: cabelo loiro, olho verde,
Dedos do pé em forma de martelo e, incrível!,
Vejo a todos que amo
Gravados nas minhas fitas de DNA.

Por que os amo?
Já descobri: não posso dizê-lo só com palavras.
Amo mamãe porque ela é quentinha?
E o homem que escolhi? Por quê?
É pela simples combinação de manifestações biológicas
Que tomam conta de mim quando os vejo,
Os toco e os abraço? Não sei.
Só sei que todas essas pessoas são preciosas informações
Escritas no fundo do meu interior.
Não tentarei entender o resto:
Seria um esforço inútil.

My first poem


Poesias nunca foram muito a minha praia. Lê-las me desconcentra (bizarro, eu sei). Escrevê-las, pior ainda. Mas ler e ouvir essa, digamos, jam poética me empolgou. Resolvi fazer um dever de casa respondendo com versos à pergunta "What does love mean to you?". E resolvi colocar na internet sem correção e sem censura, na marra mesmo, da mesma forma que um pai faria ao jogar uma criança na água para ensiná-la (?) a nadar. Espero que gostem.

I’m hopeless.
For the last three days, I tried to find a concept for what love is
And now I feel hopeless.
I searched within my heart for strong words,
For precise sentences and noble verses,
And all I found were cheap definitions.

What should I do?
Should I flee?
Should I not hand my English homework
To my teacher, who trusted me
And carefully chose this heart-related theme
For my weekly writing assignment?
No. That would be so ignoble of me.

Instead, I will seek for the yet deeper in me,
Carve until I discover the abyssal, the immeasurable,
I will dig, and sweat, and bleed, if necessary,
To finally find the answer.

Oh, I think I found something.
Looks like a DNA strip.
Well, it’s a DNA strip, indeed.
Shall we take a look at it?
I recognize myself in each and every allele.
There you are: blond hair, green eyes,
Hammer-shaped foot toes, and, amazing,
I see everyone I treasure the most
Engraved in my DNA strips.

Why do I love them?
I found out: I can’t define it with mere words.
Do I adore mom because she’s warm?
And how about my significant other? Why?
Because of the combination of biological signs
That take over my body whenever I see them,
Hear them, hug them? I don’t know.
All I know is that those people are precious
Pieces of information written in my very inside.
I won’t try to understand the rest of it:
That would be an effort in vain.

segunda-feira, fevereiro 16, 2009

Intervenção Urbana

Já faz um tempo que eu quero fotografar e postar aqui uma série de pinturas e stencils que tenho visto nas passagens subterrâneas para carros em Brasília. Há passagens para pedestres também, mas essas são tão podres que eu só me arrisco a ir lá de câmera se tiver alguém grande e forte comigo, hahaha.

Aproveitei o último sábado e comecei a fazer os primeiros registros. Uma das coisas boas foi a companhia: mother!

Ela levantou uma questão importante: se eu achava legal (e não ato de vandalismo) alguém usar esses espaços para desenhar e tal.

O concreto aparente, que Niemeyer adora, fica com o visual deteriorado tão rápido (tentem ver nas partes que estão sem pintura) que considero totalmente válido alguém tentar dar alguma melhorada na aparência dele. Sem contar que todas as pinturas vistas estão nas passagens há um tempão e ninguém pichou. Por sua vez, tentar fazer uma pintura ou stencil num monumento, num prédio histórico ou num prédio das quadras comerciais/residenciais é ridículo. Aí, sim, é vandalismo.

Essa pintura abstrata fica na mesma passagem da que mostrei acima. Ambas podem ser vistas na passagem da quadra 112 para a 212 Norte, no Plano Piloto.

Na assinatura dos trabalhos, está o nome Intervenção Urbana. Ainda não descobri se é exatamente um grupo e qual a história. É meio difícil investigar, porque quem trabalha com arte urbana normalmente não gosta de deixar muitas marcas. Mas, assim que eu souber, conto aqui.

E, aqui (somente para assinantes do Correio Braziliense), dá para ler uma nota sobre a intervenção Obra limpa II, que transformou o buraco do tatu (apelido dado à passagem do Eixão Norte para o Eixão Sul) em uma caverna com pinturas rupestres. Ficou muito fera. Mas, como arte urbana também não é feita para durar, já foi apagada.

domingo, fevereiro 15, 2009

Momento Ofélia

Pense numa pessoa que, até dois anos atrás, sabia preparar pouquíssimas coisas, tipo Sucrilhos, ovos mexidos, macarrão e misto-quente (lá em casa da mamis, carinhosamente apelidado de xis-teflon, devido ao aroma que se espalhava pela casa). Essa pessoa era eu.

Não que hoje eu seja, oh, uma mestra da culinária internacional, mas fiz avanços importantes. Quando se sai da casa dos pais, aprender a cozinhar melhor vira uma questão de independência. Sem contar a diversão que é.

Com tudo isso em mente, acordei cedo ontem (milagre) e rumei para o Guará, a uns 30 minutos do Plano Piloto, para ter uma aula de temperos com uma baiana agitadíssima e muito engraçada, dona Maria do Carmo Morais, 61 anos, culinarista com 35 anos de profissão (antes, era costureira).

Dona Carmo é legal, entre outras coisas, porque pensa parecido comigo, gastronomicamente falando. Detesta a praga do excesso de alho em todas as preparações e abomina os restaurantes self-service que salpicam cebolinha, coentro e/ou cebola crua em tudo para decorar os pratos (pense em uma pessoa que cata todas as cebolinhas: sou eu). Defende que tempero bom é aquele colocado em pequena quantidade e balanceado com os demais ingredientes.

Sendo assim, não haveria pessoa melhor para me ensinar o assunto. Como a lição foi uma espécie de amostra grátis, achei que seria bacana compartilhar o aprendizado aqui. Quem quiser fazer esta e outras aulas pode ligar no número 3301-8340.

Cozinhar batatas
Para ela ficar gostosa, não é necessário cobri-las de água e encher a panela. Pelo contrário. O ideal é colocar água pela metade da altura dos tubérculos para que ela evapore por completo. Quando isso acontecer, você saberá que a batata ficou pronta. Para dar cor e sabor, mas sem excessos, vale colocar meio pacotinho de Sazon para quatro batatas. A dica vale para os legumes preparados com água. Ah, o fogo tem que ser baixo.

Frango
Nunca, jamais, em tempo algum, se cozinha em água. Senão, fica fedido, com gosto de pena molhada (urgh).

Pimenta-do-reino
Combina com tudo. Só não faz bem para quem tem problemas de estômago e hemorroidas. A proporção de uso é, normalmente, uma colherinha de chá para 1kg de carne.

Louro
Como é bom para digestão, costuma ser usado para temperar o feijão e todas as carnes de sabor forte, como a de porco. Usa-se uma folha grande para 1kg de carne.

Orégano
Fica gostoso não só nas massas e nas pizzas, mas também em receitas com frango, no peixe assado, na batata assada e nos legumes.

Cominho
Usa-se para dar sabor a porco (é o tempero básico, aliás, junto com alho e limão), fígado bovino, frango caipira, codorna, cordeiro e a alguns tipos de carne de caça, como javali.

Páprica
A doce dá um sabor acentuado ao frango xadrez, ao porco agridoce, às sopas, etc. A picante é forte como pimenta. Dá cor e gosto às carnes de peixe e frango.

Curry
Fica melhor em receitas de frango ou carne de porco. Não se usa em carne vermelha. Uma pitada por quilo é o suficiente para nós, não-indianos, não passarmos mal. ;-)

Noz moscada
Nada substitui o sabor deste tempero maravilhoso. É indispensável ao molho branco. Pode ser usada também em peixe assado, lombinho de porco e em tortas salgadas e doces (como a de banana!).

Colorau
Não se usa para muita coisa além da preparação de caldos. Também quebra um galho quando se quer preparar um peixe e não há páprica.

Vou continuar amanhã para o post não ficar muito comprido. Beijos!

sábado, fevereiro 14, 2009

Destinos de uma navegação errante - 3

Começa agora mais uma emocionante revelação das melhores buscas que levaram a este blog nesta semana. Apreciem. ;-)

Qual o remédio para a preguiça?

Quem descobrir me conta, please. Eu tenho tentado o chá verde. Funciona na maior parte das vezes.

Xenical faz mal à saúde
Veja bem, eu nunca tomei, mas não duvido que faça mal. Pelamordedeus, gente, um remédio que tem a incontinência fecal listada entre as possíveis reações adversas não pode fazer bem. Obs.: eu não inventei isso, está na bula.

Comendo vigem
Hum... uma letra pode mudar tudo, meu bem. Decida o que você quer.

ww.novelas.com/recor
Oi?

Fotos de arvorés com flores cor de rosa
Jesus é o jardineiro e as arvorés somos nozes.

Eu quero o número do telefone dos cabanos
Eu
também quero. Vou ligar lá e perguntar quem eles são, posso? ;-)

Site do garoto de Corumbá que nasceu chifre
Taí, galera, a busca da semana. Será que o internauta em questão estava procurando por Corumbá de Goiás ou do Mato Grosso do Sul? Porque se for o de Goiás, eu estive lá recentemente! Poderia ter visto um garoto de chifre e ficar na dúvida se ele, como as garotas goianas de Harajuku, era de verdade! Inacreditável. Mais sinistro que isso, só o bebê-diabo do Notícias Populares. Cara, gelei.


sexta-feira, fevereiro 13, 2009

L. me dá trabalho

Uma mensagem.

Prezada Mariana,

Descobri o seu blog recentemente e acesso todos os dias desde a cidade onde eu moro, (nome omitido), nos Estados Unidos. Sou brasileiro e estou aqui já há 18 anos. Venho por este e-mail falar de uma obsessão algo estranha, mas que me deixou arrebatado. O pior é que minha mulher, também brasileira, descobriu tudo ao fuçar meu computador e está furiosa. A história que vou te contar não ajudou muito a melhorar o nosso casamento, que já não andava lá essas coisas.

Para que não fique toda vaidosa, antecipo que a coisa não tem nada a ver com você. Você já passou, e bastante, da faixa etária que um dia descobri que de fato me interessa. Meu negócio é com L., que achei por acaso num dia em que saí a navegar em busca das minhas meninas. O encanto está no fato de L. ser diferente demais de todas elas. Se eu bem entendi a história, L. não tem nada a ver com essas aí que se encontram aos montes pela rede.

Quem mais hoje, meu Deus do céu, só quer um diário, um DVD pirata, um tocador de MP3 e um amor bobinho de escola? Vai tentar achar alguém assim nos Estados Unidos. Vai tentar achar na web alguém que tenha a ver comigo. Essas meninas de hoje, aqui, principalmente, já chegaram aos 30 – têm desejos e queixas incompatíveis com a própria idade - e nem se deram conta do fato. Só servem para encher a paciência. Para mim, rendem um encontro e tchau.

Desde que descobri L., eu saio e volto do seu blog para me embeber de L. Preciso dela diariamente. Se possível, a cada hora. Pode ver aí no seu contador: as visitas que você recebe desde este fim de mundo na América do Norte só podem ser minhas.

Minha mulher sempre foi ciumenta e tratou de descobrir logo dos meus seis, sete, oito acessos por dia, sempre no mesmo endereço. Tenho a impressão de que, para ela, foi pior do que ver um site qualquer com todas aquelas Barbies que o pessoal daqui adora. Já está falando em separação, em processo e em volta ao Brasil, entre tantas outras coisas sobre as quais estou zero a fim de pensar.

Meu negócio é outro.

Não venho pedir que converse com minha mulher e defenda este seu leitor. Não quero que diga que essa história em nada precisa atrapalhar a boa relação que tenho com ela.
Só preciso que você me diga o quão real L. é.
Ela é sua irmã? Sua sobrinha? É sua vizinha ou filha da sua manicure?

Preciso saber se ela é comprida e magra, ou se é uma brasiliense mignon como outras tantas que vi quando estive na cidade há mais de 20 anos.
Preciso saber se sonha comigo perto dela e quão aberta está para viver uma história livre de convenções. E, ainda que não esteja, ela tem que saber que, de tão longe, alguém a quer.

Por favor, diga-me pelo menos como devo imaginá-la.

Se bem a acompanho, Mariana, imagino que você vai querer publicar esta carta porque a história é, como você gosta de dizer, surreal. Não me oponho. Mas, por favor, não deixe que ninguém mais me identifique. E, se não for pedir demais, corrija algum erro de português que tenha ficado. Esse negócio de ficar tanto tempo tão longe mexe com a cabeça da gente. É algo que, se você ainda não sabe como é, ainda vai saber.

Sinceramente, V.

-------------------------------------

E uma resposta.

Prezado V.,

Por mim, você pode imaginar a L. da maneira que quiser.
Ela é de mentira mesmo... Então, tanto faz.

Na condição de autora de todos os personagens deste blog, defini mui democraticamente que todos eles só passeiam, comem, estudam, viajam, vão ao banheiro, catam coquinho no shopping e dormem com quem eu decidir. E você não me parece uma boa pessoa para acompanhar alguém com as qualidades de L.

Sugiro que pare de empatar a vida da sua mulher e de perturbar todas as outras moças da web e vá lavar uma louça. Como dizem os americanos, get a life.

Atenciosamente, Mariana -- a matusalém de 27 anos que te criou.

PS.: quer fagocitar a minha personagem, me chama de velha e ainda pede para fazer revisão de texto? Vai ser cara-de-pau assim lá na casa do chapéu.

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

Comer bem por aí - 3

Infelizmente, ninguém procura este blog (ainda) usando as palavras "dicas de viagem" no Google (vou fazer um post esta semana mostrando mais buscas toscas, aguardemmmm). Snif.

Mesmo assim, vou terminar a listinha barceloneta que comecei dois posts atrás. Vejam se não parece tudo gostoso. ;-)

Cacao Sampaka

É uma chocolateria fera que conseguiu agregar vários outros produtos e serviços fofos sem perder a identidade nem a qualidade. Resultado: a qualquer hora do dia em que se vá, sempre haverá uma turminha comprando chocolates ou degustando outras coisas. Todas as palavras do mundo não serão suficientes para descrever o chocolate quente puro oferecido pela loja. Vou ficar com "forte", "aromático" e "sedoso" só para dar uma ideia. Outra loucura é o chocolate branco com rosas. Provem. Na saída da loja, uma plaquinha mostra o quanto os donos estão podendo (ou acham que estão). Nela, se lê: "O cliente sempre nos dá razão". Menos, gente. :-P
Carrer Consell de Cent, 292, Eixample. Aliás, fica perto de uma das unidades do Hostal Martina (na Diputació), que é dispensável...
Outros lugares para ir atrás de chocolates:
Oriol Balaguer e Enric Rovira. Mas esses eu não conheço.


Tapa Tapa
Pela localização e pela frequência, tem todo o jeito de roubada de turista. Mas pode ir sem medo! A comida, o preço e o atendimento são ótimos. E o lugar tem uma coisa que até então era inédita para mim: cardápio no jogo americano (tipo aqueles do McDonald's) todo ilustrado com fotos superesclarecedoras. Precisa mais?
Passeig de Gràcia, 44, esquina com a Consell de Cent; 93-488-33-69.


Tapaç 24

Pertinho do Tapa Tapa, mas com um clima totalmente diferente. Aqui, a maior presença é de locais (o que é bom) que vão lá para fazer almoços no estilo business-engravatado -- o que é ruim, porque o clima é mais formal e, os preços, mais altos até em itens básicos. Eu não desgostei do lugar, mas também não recomendaria.
Carrer Diputació, 269, 934-880-977.
Outros lugares para experimentar tapas:
Paco Meralgo (sacaram o trocadilho infame?) e Sagardi. Não conheci nenhum deles, mas posso dar a dica sobre o segundo: cheguem cedo, muito cedo, ou façam reservas. Do contrário, encontrarão o lugar irremediavelmente tomado.

É isso galera. Para quem ainda não cansou, recomendo esse ótimo post sobre o que não fazer em Barcelona. Beijos!

quarta-feira, fevereiro 11, 2009

Duas coisas


Eu sei que este virou um blog com posts diários e que prometi um para hoje, mas estou podre.
Preciso desligar o computador e me recolher aos meus aposentos. ;-)
Amanhã eu falo mais de comidinhas gostosas, de viagem, de qualquer coisa que quiserem.

Vou aproveitar e agradecer ao Zé, que botou link para o meu blog aqui. Valeu, cara!

A foto é de um labralata lindo e superdigno que vi em Morro de São Paulo, Bahia, há uns dois anos.

terça-feira, fevereiro 10, 2009

Comendo bem por aí - 2

A parte 2 da história dos cartões de restaurante que estão guardados desde maio passado na minha bolsa vai sem foto por um motivo patético: a primeira metade das fotos que fiz da viagem para Barcelona foi para um CD que -- só descobri no Brasil -- estava em branco. Vocês acham que eu fiquei muito ou pouco indignada com a minha falta de checagem? Pois é.

Todas as lindas imagens que fiz da Boquería, do Palau de la Música e de outros tantos lugares e comidas incríveis foram para o limbo, o que me obriga a voltar à cidade um dia para fotografar tudo de novo. Ai, que vida difícil. :-)

Essa viagem serviu para comprovar uma coisa: dicas de viagem ajudam à beça. Mas, no fim das contas, quem sentencia se elas valem a pena ou não é pura e simplesmente o viajante.

O modo como acabei conhecendo o Orígens - La llavor dels (o catalão não é uma língua ótima?), no Bairro do Borne, foi meio torto, mas bacana. A ideia inicialmente era conhecer o Inopia, que fica do outro lado da cidade (Tamarit 104, Eixample Esquerra; 93-424-5231), bar de tapas de Albert Adrià, irmão daquele que é considerado o melhor chef do mundo na atualidade.

Li a dica na revista Viagem & Turismo, da Abril, que elogiou os petiscos clássicos e os preços justos do bar. Quando me vi perto de lá, pensei: é agora!

Cheguei às 19h e o lugar já estava lotado, com seguranças pit-bull e corda na porta. Fiquei esperando com uma galera e vendo que os pit-bulls liberavam a entrada de pessoas que chegavam depois, mas já tinham amigos com mesa lá dentro.

Pergunto novamente: vocês acham que me indignei muito ou só um pouquinho?

Resolvi procurar alguma coisa legal perto. Não rolou. Aquela banda do bairro é muito residencial. Peguei o metrô até o Raval, outro lugar que me venderam como o paraíso na Terra. Depois de ver uns três bares/restaurantes estranhos e/ou caros, uns 15 açougues islâmicos e uns 22 cabeleireiros indianos, caí fora. (Depois, me lembrei que o lado bom do bairro está perto do Museu de Arte Contemporânea de Barcelona, o Macba).

E me lembrei de uma espécie de praça no Born -- o Passeig del Born -- que reunia uma série de lugares para comer. Foi lá, já com o estômago colado nas costas e os pés cansados, que achei o Orígens e descobri que o fair trade, o comércio sustentável, a valorização dos produtores e dos produtos locais (ou pelo menos a propaganda de tudo isso) é uma tendência irreversível na gastronomia. O cardápio é bem mais extenso do que os que estamos acostumados a ver porque permite saber a história e as propriedades de cada um dos ingredientes usados nas receitas.

Não lembro de tudo que comi -- só de um creme de aspargos, para falar a verdade -- mas achei tudo gostoso e muito bem-feito. Ou teria sido a fome a responsável pelo meu encanto? Ah, acho que não. O negócio é bom mesmo. E os preços e serviços não decepcionam.

ORÍGENS - LA LLAVOR DELS
Passeig del Born, 4, Barcelona; 93-295-66-90. Diariamente, das 12h30 à 1h. Metrô: linha 4.

Vou fazer uma parte 3 desse post porque, ao tentar lembrar qual era mesmo o nome do bar do Adrià, descobri um milhão de lugares para recomendar e desaconselhar. Isso, claro, se ninguém aí estiver de saco cheio de histórias de viagem. ;-)

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

Comer bem por aí - 1



Descobri que há meses venho carregando na minha bolsa verde (do trabalho) dois cartões de bares /restaurantes das últimas férias.
Decidi que eles seriam os temas dos posts de hoje e de amanhã. Um sobre Madri e o outro sobre Barcelona, que tal?
O primeiro cartão é do Mesón del Champiñon, na capital espanhola. Curiosamente, ele fica perto -- ao mesmo tempo -- de uma região com várias roubadas gastro-turísticas e de outra com várias coisinhas interessantes. A região das roubadas é a Plaza Mayor. Nunca tente achar nada legal por lá. Tá na cara que é tudo estranho. E a das coisinhas legais é a Cava de San Miguel (o lugar que conheci fica no número 17; 91-559-6790), que reúne ainda mais bares de tapas. Me lembro em particular do Mesón de La Tortilla (no número 15), onde teria ido se tivesse sobrado tempo (e bucho, hehe).
Trata-se de um lugar simples, mas que oferece um dos petiscos mais Iloveyou que já provei: cogumelos grelhados com azeite, salsinha e sal. Os cabos dos champignons são cortados para dar lugar a um pedacinho de presunto cru. Não lembro quanto paguei, mas não era caro e a porção tinha um bom tamanho. Gostei tanto que deve ter sido por isso que guardei o cartão até hoje na bolsa. Se você tem viagem marcada para Madrid, vá. Esqueça a frescura -- você vai ficar de pé, com uma galera em volta e um cheiro de cigarro -- e veja se é bom ou não é.
Não tirei fotos, mas achei essas daqui, que servem para tentar aqueles que se perguntam se comem ou se tomam água e mexem os dedinhos até a fome passar. :-)
Outro lugar fera é a Sidrería El Tigre (Calle de las Infantas, 30, Chueca), onde fui parar depois de uma viagem malsucedida -- queria ir ao Bocaíto, perto dali, para comer o que me venderam como as tapas favoritas de Pedro Almodóvar e encontrei o lugar fechado. Quer dizer, malsucedida o cacete. O lugar é sensacional. Oferece opções para os mais e os menos durangos.
Os mais pedem uma cerveja e ganham um petisco sem pagar um euro extra. Os menos pedem uma cerveja ou uma sidra tirada na serpentina (deliciosa, nada a ver com Cereser) e o cardápio, que é cheio de coisas fofas. A variedade de queijos, frios e tortillas, tudo perfeito, chama a atenção. Mais uma vez, come-se de pé, em meio a frequentadores totalmente locais. Não repare no chão cheio de guardanapos. Bar de tapas e lata de lixo são dois conceitos que, aparentemente, ainda não se encontraram.
Na rua em frente à Sidrería, ainda há um restaurante italiano legal para quem quiser variar entre um petisco e outro. Esqueci o nome, mas não é difícil de achar.
Outras dicas que sei de cabeça:
- Museo del Jamón: estão espalhados por Madrid. Encontre o mais perto do seu hotel aqui.
- Rua Caballero de Gracia, perto da Gran Vía: impossível falar de um lugar só nesta rua. A partir do Frescco (um lugar bom para quando o corpo pedir vegetais folhosos), existe uma infinidade de restaurantes de vários estilos, inclusive um contemporâneo excelente, barato e com serviço rápido, cujo nome me esqueci (juro!), mas é só procurar pelos garçons com jeito de filipinos que você acha. Também fui numa baladinha ótima, ou que pelo menos costumava ser assim, nessa rua. Mais detalhes aqui.
É isso, minha gente.
Na falta de uma imagem de algum dos lugares acima, usei a foto que tirei num bar/restaurante fera em Toledo, a uma hora e pouco de Madri. Se chama Alfileritos 24, fica na rua de mesmo nome e é também fantástico. Beijos.

domingo, fevereiro 08, 2009

Um sábado

Sábado, 7 de fevereiro, perto das 14h30. Acordo batendo de leve a lateral da cabeça na janela da van e vejo uma moça com uma fantasia indefinível descer as escadas de uma antiga pousada na cidade de Corumbá, no interior de Goiás. É uma roupa preta e rosa-choque, e sua dona me parece um tanto orgulhosa por vesti-la.

Não sei dizer quais são suas intenções. Parece uma garota de Harajuku, aquele bairro de Tóquio famoso pelas meninas de vestes loucaças. A mulher de preto e rosa ainda tem outro ponto em comum com suas similares japonesas: tira fotos de si mesma com uma super-ultra-câmera digital de mega-resolução-plus.

Gostaria de poder perguntar a alguém se estou vendo algo real ou se aquilo é fruto de uma alucinação causada por três horas de sol no cocoruto e remadas non-stop. Mas meus companheiros de van, já despertos, correram para o interior da pousada.

Vou ao banheiro lavar o rosto e dou de cara com mais duas admiradoras do Harajuku way of life: uma fadinha de asas brancas de pelúcia e outra toda vestida de verde-abacate, provavelmente uma fã da Sininho. Quero saber o que está acontecendo, mas os pensamentos vêm devagar e a voz não sai.

Quando me encontro com Erasmus, pergunto imediatamente:
- Você viu o que eu vi?
- O que você viu?
- Uma maluca de preto e rosa, uma fada e uma Sininho. Acho que viemos parar numa convenção de personagens de histórias infantis.
- Ali, junto com aquele cara de quimono e aquela Minnie de salto alto?
- Isso.
- Gente estranha - ele responde, me abraçando.
- Me tira daqui AGORA, please.
Fui rapidamente atendida.

Começo a achar novamente que o mundo faz sentido quando olho para um enorme e cheiroso bufê de comida caseira, com todas as cores e sabores e nutrientes necessários para quem acordou de madrugada, vestiu capacete e colete salva-vidas e se meteu num bote para remar e descer corredeiras. Encho o prato e respiro fundo enquanto como. Esse negócio de fazer rafting é uma delícia, mas consome as energias do cidadão. Volto ao bufê na dúvida se devo repetir os pratos salgados ou se experimento a sobremesa. A visão de suculentos e lustrosos figos em calda me ajuda a decidir.

Antes de devorar os figos, no entanto, avisto novamente a trupe de fantasiados. Meu prato quase cai em meio ao susto. Já passou, penso. Já passou.

Eu não parei em Corumbá, que fica no caminho de Brasília para Pirenópolis, depois de ser abduzida por extra-terrestres. Fui lá de livre e espontânea vontade, com reservas feitas uma semana antes, para participar do quarto rafting da minha vida. Engraçado isso: moro em Brasília há 16 anos e fiz rafting pela primeira vez há cinco. No entanto, sempre remei muito longe (em Gramado, no Rio Grande do Sul; em Mendoza, na Argentina; e no interior do Peru, a uma hora de Cuzco).

Não tinha me dado conta de que havia um rio tão pertinho daqui para matar a saudade de um dos poucos esportes radicais de que gosto (os outros dois são parapente e mergulho). Pois é. Apesar de bem menos rápidas do que as dos rios que já conheci - daí a necessidade de remar tanto, o tempo todo -, as águas do Corumbá proporcionam uns passeios legais e com quedas mais fortes do que em qualquer lugar onde já fui.

O que mais dizer? Que a paisagem é como em qualquer lugar onde se pratica rafting: maravilhosa. Lá, o cerrado não é nada tímido. As árvores são cheias e muito próximas umas das outras. E certas partes do rio são tão preservadas que ver borboletas (um indício da limpeza do lugar) é facinho. Eu mesma enxerguei duas azuis gigantes - longe de serem um fruto de qualquer alucinação. Observei um casal de corujas quietinho debaixo de uma ponte. E vi, no caminho, um monte de gente que olhava os botes e dava tchauzinho para os remadores. Muito legal.

No finalzinho do passeio, a uns 15km do ponto de saída, uma galera de locais estava à beira do rio. Todo o mundo nos dois botes achou que finalmente ia ter seu momento de fama quando viu que havia uma ambulância dos bombeiros no local. A multidão de curiosos estava de olho não no rafting, mas na possibilidade de ver um corpo sair do rio. Shit!

Por causa disso, tivemos de parar um pouco mais à frente. No problem. Quem já remou um tantão pode remar outro cadiquinho.

Antes de entrar na van e cochilar antes do almoço, deparei com um grupo de três crianças locais que me olhavam como quem dissesse: "Leve-nos ao seu líder". A mãe, uma jovem senhora de olhos azuis e lenço na cabeça, enxotou-as dali no minuto seguinte.

Mal sabia eu que este não seria o único momento inusitado da viagem. O que prova o seguinte: quanto mais a gente escreve sobre surrealidades, mais elas acontecem com a gente.

----------------------------------------------

Para saber quem oferece serviço de rafting no Rio Corumbá, clique aqui. O passeio dura em torno de três horas. E o pacote que contratei dá direito a almoço na pousada onde vi uma garota de Harajuku aportar em terras goianas.

sábado, fevereiro 07, 2009

Grace - parte 2

Continuação do post logo abaixo. Aiaiai de quem ler o final antes do começo!

A maneira como consegui ficar com o Bernardo foi patética e totalmente desaconselhável, embora tenha dado certo. O deputado contou que tinha conversado com um juiz amigo lá na cidadezinha dele, em Minas. O juiz ia fazer o registro sem que eu precisasse passar pela formalidade da adoção, mas com um porém: eu teria que passar por funcionária da fazenda do deputado e alegar que o filho era meu mesmo, biológico, que eu era pobre e tinha sido abandonada pelo pai do bebê.

Veja você: tem cabimento uma mulher de quase 50 anos, enrugada desse jeito, passar por jovem mãe seduzida e largada? Ter, não tem, mas assim mesmo arranjei umas roupas velhas e um lenço, armei minha melhor cara de coitadinha e viajei para Minas. Faço teatro desde a juventude e posso dizer: foi o papel mais difícil da minha vida. Mas, quando voltei, meu filho já era 100% meu.

É um menino doce, inteligente, curioso e muito bem resolvido com o fato de ter sido adotado. Sempre digo que é o menino do meu coração, embora não tenha nascido da minha barriga. E ele deve entender -- ao modo dele, claro. Tanto que, esses dias, estávamos vendo o jornal na televisão e, quando apareceu uma imagem da leoa grávida no zoológico, com aquele ventre enorme, ele me fez a seguinte pergunta: “Mamãe, quando você me teve, ficou com o coração igual ao da barriga da leoa?”.

Eu respondi que sim e a gente riu muito. Ri e chorei ao mesmo tempo, mas creio que isso ele não percebeu.

sexta-feira, fevereiro 06, 2009

Grace

Inspirado em uma história de verdade. Na falta de uma imagem melhor, fico com essa, do Museu do Azulejo, em Portugal.


Dizem que o reloginho que avisa à mulher sobre o momento ideal de engravidar toca três vezes. A primeira, aos 25. A segunda, aos 30. A última, aos 35. O meu tocou bem forte nas três vezes, mas em nenhuma delas eu estava com alguém legal o suficiente para ser pai do meu filho, o que é uma pena. E aí eu me vi aos 47 anos ainda menstruando, o corpo avisando que o tempo estava para chegar ao fim e fiquei numa dúvida grande sobre o que fazer. Eu não queria passar por essa vida sem saber que tipo de mãe eu seria, mas também achava deprimente demais fazer uma inseminação artificial ou algo do tipo. Foi aí que resolvi tentar a adoção.


Fui de coração aberto, disposta a ficar com quem aparecesse. Não precisava ser bebê, nem menina, nem branca. Para parecer mais comigo, achei até melhor informar na ficha que preferia uma criança morena ou negra. E foi aí que começaram as minhas dificuldades. Passei a ouvir demais que a minha vontade era muito complicada, que a burocracia era isso, aquilo e aquilo outro, que era impossível entender por que diabos eu não queria uma bebê, menina e branca. Foi uma época de muita angústia. Várias pessoas acompanharam essa história porque eu, indignada, contava para todo o mundo. Você já percebeu que eu falo muito e ainda gosto de fazer um drama, né?


Até que um dia a minha mãe me avisou: um amigo havia dito para ela que conhecia uma moça que estava grávida, mas não queria ficar com o filho. Pensei: é agora. Assim que pude, fui conhecer a tal mulher – praticamente uma menina. Vivia em Taguatinga, numa área próxima ao Chaparral e era viúva de um rapaz morto por traficantes. Estava muito a fim de ir embora de Brasília com os pais e abriu mão totalmente da criança. Me avisou que não precisava de fotos, de cartinhas, de nada. Só de alguém que pudesse dar esse alívio para ela. Estranhamente, fiquei aliviada também.

Quando o Bernardo nasceu, dia 16 de maio de 2002, a mãe não quis nem saber de amamentação nem de banho. Fui eu que dei o primeiro banho nele. Botei a primeira roupa, um macacão vermelho que comprei em Goiânia. Meu bebê era a coisa mais gostosa do mundo. Mas, no que fui levá-lo para fazer a certidão de nascimento, meus problemas começaram de novo. Não queriam que ele ficasse comigo, sabe? Disseram que o certo, já que a mãe não o quis, era entregá-lo para o Estado e aí esperar para saber se eu realmente o adotaria de vez. Bati tanta boca, me estressei tanto, chorei igual a uma louca, tive gastrite, foi uma merda.

Aí, pensei: trabalho com o deputado há quatro mandatos seguidos e nunca pedi um alfinete sequer para o homem. Não é possível que ele não soubesse de uma forma para me ajudar.


Continua amanhã, galera.

Destinos de uma navegação errante - 2

Existe muita gente louca (para não dizer abjeta) navegando por aí.

quinta-feira, fevereiro 05, 2009

Destinos de uma navegação errante

Instalar a versão nova e melhorada da televisão de blogueiro esta semana me proporcionou inenarráveis momentos de diversão e uma certa incredulidade com os motivos que fazem algumas pessoas pararem aqui no blog. Vou fazer o seguinte: colocarei aqui alguns termos de busca que trouxeram internautas para esta página e dar minha contribuição sobre o que sei do tema. Vai que consigo acrescentar alguma informação útil à vida desses navegantes...

Água Mendoza
Uia! :-) Este blog vem em primeiro lugar no mecanismo de buscas quando são digitadas as palavras acima. O link apontado é sempre este daqui, que tem umas informações para quem planeja viajar para Mendoza. Se tivesse que acrescentar alguma coisa hoje, diria que, perto das montanhas dos pré-Andes, a água é escura e barrenta por causa dos sedimentos que caem de lá de cima. Mas quem sair da cidade e ir em direção à fronteira com o Chile, logo depois da cidade de Uspallata, vai encontrar águas limpíssimas e termais, como as que correm debaixo de um hotel abandonado construído com rochas da montanha. É um passeio que vale muito a pena.

Albergue Lua Cheia preços
Não lembro direito quanto paguei quando estive lá, há uns três anos. Acho que foram R$ 60 por um quarto individual com cama gigantesca e chuveiro elétrico, tudo totalmente excelente. Mas não recomendo para quem viaja de casal porque se ouve tudo de todos os quartos. ;-) Para quem está só ou com amigos, é perfeito. Mais informações no site do albergue.

13 anos
É a idade da personagem deste post, uma figuraça louca para ter um DVD da dupla Pedro Paulo & Matheus (aliás, ganhei um ontem). É uma idade ao mesmo tempo legal e chata, porque ao mesmo tempo em que se tem uma vida inteira pela frente, não se tem liberdade nem maturidade o suficiente para desfrutá-la. Meus 13 anos até que foram bons, mas honestamente prefiro os atuais 27.

Antes e depois da malhação
Neste post de outubro de 2004, eu ainda tinha a ilusão de ficar como as moças de Modigliani depois de uma combinação infalível de malhação destroy e dieta à base de endívias. Ah, eu era tão inocente...

Mercado putas
Quem digitou isso no Google e veio parar neste blog achou esse post sobre a Daspu. Só digo que continuo achando o máximo a ideia de Eliana Tranchesi vender Daspu na Daslu. É o único saber que tenho sobre o assunto.

Números de putas
Sem comentários, gente.

Por que as calças jeans de hoje não cabem em mulheres bundudas?
Cara, essa foi a pergunta de busca mais genial!!!! E a resposta é simples, ora: porque toda e qualquer peça e/ou tendência da moda de hoje exclui toda e qualquer mulher que tenha alguma carne no corpo. Calça skinny, sarouel, volumes e companhia só ficam bem nas altas e magrelas. Mais resmungos sobre o mundo fashion aqui, neste post de um tempo em que eu ainda me dava ao trabalho de tentar comprar um jeans.

Um comentário, por favor

Algumas pessoas vieram me falar que gostariam de comentar aqui, mas que não têm Gmail e que o Google pede para fazer um cadastro enorme antes de mais nada. E então, por preguiça de encarar o processo todo, acabam desistindo de dizer aquele "Eu estive aqui" básico.

Para essa turma, digo o seguinte: não tem mais desculpa! :-)
Segue abaixo o passo-a-passo. É mega-simples.

1. No final de cada texto, existe um link para comentários. Clique nele.
2. Uma janelinha se abrirá. Escreva o que tiver de escrever.
3. Clique na bolinha ao lado de Nome/URL. Se você não tiver site (ou seja, URL), não precisa colocar. Ponha só o seu nome mesmo. Outra opção é clicar na bolinha ao lado de Anônimo (aí, claro, vai ser muito mais fera se você assinar a mensagem).
4. Se quiser ver como vai ficar o comentário, clique no botão azul para visualizar. Senão, clique no laranja. Finito!

É isso. Mais tarde eu venho aqui de novo escrever texto de verdade. Beijos.

quarta-feira, fevereiro 04, 2009

Andréa - Um texto de ficção, parte 2

Por favor, não siga lendo este texto se você não acompanhou o começo da história, contada logo ali embaixo. Trapacear e ler o fim das coisas antecipadamente é para os fracos, ora.
Beijos, Mari.

---------------------------------------------

Conduziu o carro em direção a uma área de cerrado deserta e próxima ao Lago Sul, onde tinha visto queimarem lixo uma vez. No caminho, mordia os lábios de tanto nervosismo. E se perguntava quem teria denunciado. Talvez, o ex-noivo, pensou. Ele cismou que ela havia lhe dado um chifre durante uma dessas viagens. Não adiantou explicar uma, duas, três vezes que nada tinha acontecido.

Poderia ser a atual namorada do ex. A moça, outra ciumenta surtada, andou seguindo-a e telefonando sem dizer quem era. Quando descobriu onde Andréa morava, tentou invadir a quitinete e afastar as consumidoras.

Ou, quem sabe, a mãe ou o irmão mais novo. Dona Marli não aprovava o sustento da filha de jeito nenhum — ao mesmo tempo, nunca contou para o pai. Kleber praticamente deu um piti quando soube o que a irmã fazia para ajudar a pagar-lhe a faculdade. Depois, meio sem jeito, pediu desculpas e veio perguntar se não tinha como ela incluí-lo no negócio.

— Tutti buona gente — murmurou, lembrando a frase que tinha aprendido com uma das clientes.

A cidade ainda estava escura. De sacola nos braços e luvas nas mãos, Andréa pegou uma pequena trilha e caminhou em direção a um monte de entulho. Eram tantas as pedrinhas e tantos os buracos no terreno de argila dura que ela quase torceu o pé direito. Não parecia haver uma viva alma a quilômetros de distância. Se houvesse, estava ferrada.

Despejou o conteúdo da bolsa em meio ao entulho. Quando acabou, juntou a própria sacola ("que material vagabundo, não vai fazer falta", pensou) e as luvas. Jogou a garrafa inteira de álcool e acendeu o isqueiro. O fogo pegou logo. Ainda olhando para o montinho, deu alguns passos para trás até se convencer de que tudo queimaria por completo. Depois, virou-se e caminhou o mais depressa que pôde até o carro. Dirigiu rápido também. Só freava para não ser pega nos pardais.

Quando chegou, a polícia ainda não tinha chegado. Sentou-se na cama, acendeu um cigarro e se pôs a esperar, com as mãos trêmulas. O cigarro se extinguiu. Andréa trocou de roupa. Preparou café. Acendeu mais um. Fez a pedicure. Começou a organizar os armários para se certificar de que não sobrara mais nada da mercadoria. A madrugada se transformou em manhã. E a campainha tocou.

- Polícia Federal — anunciou uma voz feminina.

Andréa ouviu de olhos fechados os termos do documento. Abriu a porta.

- Entrem — disse, num suspiro.

"Nem veio muita gente", pensou, enquanto encostava-se na parede ao lado da porta e observava sua quitinete cuidadosamente arrumada ser posta de ponta-cabeça. Roupas, revistas, livros, fotos, sapatos, produtos de limpeza, os poucos copos, pratos e talheres que tinha, tudo ficou fora do lugar.

A busca terminou. Ninguém encontrou nada. Depois de uma formalidade qualquer, Andréa se viu novamente sozinha em 35m2 de pura bagunça. Sentou-se no chão e respirou fundo. Pensou em ligar para o celular de uma das companheiras e dizer que estava caindo fora. Receber um mandado de busca e apreensão e sair tocando fogo pela cidade eram o suficiente. Só faltava decidir o que fazer. Podia vestir um terninho dos tempos de secretariado e rumar para o primeiro preparatório para concursos que encontrasse. Podia fechar a quitinete em Brasília, voltar para a casa dos pais, em Anápolis, e usar o dinheiro que juntou para fazer alguma coisa. Podia enlouquecer de vez e ir para a praia vender artesanato.

Por ora, optou pela saída mais fácil: tomar banho e ir caminhando até a lanchonete a duas quadras dali. Banhar-se, caminhar, fumar e tomar milk-shake de Ovomaltine, não necessariamente nessa ordem, são boas coisas quando não se sabe exatamente o que fazer.

Antes de sair de casa, tentou ligar para Jussara e Mila. Celulares desligados.

Quando passou a chave na porta para voltar à rua, Andréa lembrou-se do trato que haviam feito caso fossem pegas: nunca, jamais, em tempo algum, entregar uma à outra ou colocar uma à outra em condição de suspeita.

Ao por os pés no térreo, o corpo da moça travou.
Andréa temeu que o pacto não valesse nada.

terça-feira, fevereiro 03, 2009

Andréa, uma obra de ficção - Parte 1

Andréa acordou num pulo, às 4h, quando ouviu a voz de Bell Marques, do Chiclete com Banana, na música que havia escolhido para toque de celular. Pensou imediatamente em tragédia. Em algo que poderia ter acontecido com a mãe, que era hipertensa; com o pai, segurança; com o irmão mais novo, que saía sem hora para voltar para casa durante as férias da faculdade. Do outro lado da linha, ouviu a voz sussurrando com um forte sotaque pernambucano.


-Minha linda, sou eu. Dê um jeito de se livrar da sua mercadoria AGORA, que os homi estão indo à sua casa com um mandado de busca e apreensão.

- Lascou. Obrigada, flor — disse, desligando e botando a mão na cabeça.


Precisava dar um jeito rápido, muito rápido. Felizmente, era pouca coisa em estoque, tudo dentro de uma só sacola de ginástica. Mais felizmente ainda, Jussara e Mila estavam fora da cidade. Haviam viajado para repor o estoque. As três, que se conheceram numa associação de classe forte, poderosa e dona de um gigantesco prédio na zona central de Brasília, tinham se tornado parceiras depois de se verem de saco cheio da vida, do salário e do crachá discriminatório a que tinham direito. Eram secretárias terceirizadas, uma desgraça do mercado de trabalho local. E, ao mesmo tempo, não queriam entrar na vala comum dos concorrentes aos concursos públicos voltados para pessoas com ensino médio.


Mas também eram espertas. Com os contatos que fizeram entre as madames com quem trabalhavam — e as amigas, irmãs, primas, mães, filhas e sobrinhas das moças — , montaram uma rede de vendas razoavelmente famosa na cidade. Conhecida somente no boca a boca, vale dizer, porque o campo de atuação do trio era absurdamente ilegal. As três compravam no Paraguai e comercializavam no Distrito Federal cópias quase perfeitas das lingeries, dos cremes cheirosos e dos perfuminhos fabricados por uma cobiçada marca norte-americana. A vantagem estava nos preços, 50% menores do que os dos originais. E o atendimento era feito com precisão. Com agenda organizadíssima, com hora marcada para no máximo duas mulheres por vez e sempre num lugar diferente. As jovens moravam em quitinetes bem afastadas umas das outras, todas em prédios comerciais sossegados.


As compradoras enlouqueciam. Andréa, Jussara e Mila haviam conquistado gente de diferentes idades, origens, classes sociais e profissões. Inclusive uma policial federal — pernambucana radicada em Brasília — que se descobriu outra mulher depois de experimentar o hidratante com aroma de mirtilo e chantili. Essa mesma que ligou para a fornecedora às 4h depois de saber da existência de um mandado de busca e apreensão dirigido a ela.


Se algum dia qualquer uma do trio fosse pega, o combinado era que uma jamais entregaria a outra. Mas, em dois anos, nunca precisaram colocar o trato em prática. Se recusavam a viajar juntas em ônibus de sacoleiros. Preferiam rotas alternativas pela Argentina. Quando a grana ficou melhor, podiam dar-se até ao luxo de viajar de avião. Buscavam passagens baratas pela internet e iam. O segredo era nunca fazer farofa, falar alto, nem usar roupas chamativas. Preferiam as calças feitas na costureira, a falta de maquiagem e os pseudo-óculos de grau com aros grossos.


- Ninguém olha para mulheres assim — justificou Mila, bem no começo da empreitada.


Andréa não teve muito tempo para pensar. Promover uma revoada de calcinhas, sutiãs e cintas-liga através da janela da quitinete (já pensou?) era fora de cogitação. Primeiro, porque chamava a atenção demais. Segundo, porque ninguém pegaria aquilo tudo àquela hora da madrugada. Terceiro, porque continuaria sem saber o que fazer com os creminhos que sobravam. Vestiu os pseudo-óculos (davam-lhe um ar intelectual) e teve uma ideia. Nem sequer trocou de roupa: saiu de quimono e chinelos. Pegou a bolsa de ginástica, um par de luvas de borracha, uma garrafa de álcool, o isqueiro Zippo comprado no Paraguai e a chave do Uninho.


Conduziu o carro em direção a uma área de cerrado deserta e próxima ao Lago Sul, onde tinha visto queimarem lixo uma vez. No caminho, mordia os lábios de tanto nervosismo.


------------------------------------



Se tudo der certo, continuo amanhã, minha gente. Beijos.