Há uns dias, estava meio sem idéias para escrever no blog – quando me deparei com este ótimo texto de Ricardo Calil no site No Mínimo, um dos meus preferidos. Ele discute o livro O Brasil dos gringos: imagens do Brasil no cinema e o documentário Olhar estrangeiro à luz de um filme que está para estrear: Turistas, sobre um grupo de mochileiros que passa por sérios perrengues em terras tupiniquins. E aborda, ainda, diversos outros filmes que têm as nossas paisagens como cenário, embora suas tramas limitem o Brasil ao trinômio carnaval-sexo-Amazônia (e variantes).
A diretora do documentário conversaram com vários cineastas que rodaram no Brasil e chegou a duas conclusões: 1) Que eles não fizeram o dever de casa quando decidiram filmar no país; 2) Mesmo quando conheceram o Brasil e viram que a nossa terra não reproduzia fielmente o que eles tinham ouvido dizer... esses caras ligaram o foda-se e decidiram que filmariam uma terra estereotipada assim mesmo. Babacas!!!
O texto me fez pensar sobre as raízes da criação desses estereótipos. Pelo menos por enquanto, acredito que a culpa não é exclusivamente dos gringos que vêm aqui filmar e só vêem o que querem. Há muitos anos que gente brasileira também contribui para que as nossas imagens lá fora não sejam lá as mais realistas (é esse o questionamento que o autor do texto do No Mínimo deixa ao final do artigo). Vou contar uma historinha pra tentar embasar essa hipótese.
Há exatamente um ano, era uma das poucas repórteres a cobrir um eventão de tecnologia e segurança pública em Foz do Iguaçu. Havia um monte de expositores, gente das polícias federal, militar, civil, etc., quase todos homens, de várias partes do Brasil e do mundo. Numa noite, fomos todos jantar numa churrascaria em que havia um tal de show folclórico (é o que você está vendo nas duas fotos acima). Mas se a gente chamasse aquilo de freak show, dava no mesmo.
O cenário não poderia ser mais kitsch: eram reproduções em fibra e espuma de cenas do "cotidiano" dos índios: remando os barcos no rio, desfilando pelados na floresta, etc., etc (na foto de baixo dá para enxergar melhor, creio). Foi ali que se desenrolaram blocos com danças dos orixás, capoeiristas acrobatas, coreografias, indígenas e por aí vai. O ponto alto do show era quando uma miniescola de samba subia ao palco com duas mulatas.
Naquele momento, o mestre-de-cerimônias do show passeava de mãos dadas com as moças, indo de um lado a outro do palco. E dizia coisas do tipo: "Vejam a beleza da mulher brasileira. 1,70 de pura sensualidade. Pura malícia. Essa é Andréa, a mulata tchu-tchu-tchu. Vejam a bunda da mulata. Quem quer dar um beijo na bunda da mulata?" Naquele momento, me perguntei a diferença entre show folclórico e mercado de carne. Também aí, vi uns 400 caras (principalmente os gringos) se transformarem em meninos de 5ª série enquanto Andréa rebolava ao som do sambinha: tchu-tchu-tchu-tchu-tchu-tchu-tchu-tchu... Para completar, três ou quatro respeitáveis gringos foram convidados a subir ao palco para dançar com as mulatas e os percussionistas. E aí demonstraram toda a ginga e malemolência atribuídas aos que vêm do lado de lá do Equador.
Acho que é principalmente essa a informação que chegava e ainda chega a quem está em outros países, ou não? Senão pelos shows folclóricos, pelas antigas propagandas da Embratur, pelas historinhas da Disney ou pelos filmes da era da Embrafilme. É algo que vem desde o Brasil-Colônia. E não sei se um dia a gente consegue mudar isso...
P.S.: Apesar de indignada, preciso reconhecer que também tenho meus preconceitos. Pretendo ver Olhar estrangeiro e Turistas... mas também aguardo ansiosamente a estréia daquele filme do Cazaquistão.
3 comentários:
Mari
Eu comoartilho da sua indignação e também da sua opinião: acho que parcialmente cai em nós a culpa desta reprodução imagética brasileira.
Cito outro exemplo.
Morávamos nos EUA, em Washington. Papai era assistente do adido militar na Embaixada Brasileira. Rola direto comemorações, eventos e tal.
Na feira dos países, um festival de imagens estereotipadas porém icônicas de todas as nações:
Os argentinos levavam um casal dançando... tango (bingo!)
Os alemães demonstravam a Holzhacker (tradicional da Bavária)
Os espanhóis, flamenco
Costa-riquenses, rumba
Os brasileiros... samba e mulatas desbotadas, passando frio e pagando mico, claro!
Lutamos para um dia tentar levar outra coisa. Mas o que seria?
Essa era a questão.
Sugeri o frevo. Pelo menos é beem mais difícil de ser executado, requer arte e engenho, e as pessoas estão mais vestidas :)
E tenho uma sugestão: se cada brasileiro FELIZ que estivesse hoje morando no exterior NÃO levasse a imagem de que aqui só se dança samba, já conseguiríamos uma revolução.Que tal?
Vamos bater nas portas da WorldStudy, Experimento, Central de Intercâmbio, Student Travel Bureau e StudyAbroad com uma cartinha falando sobre isto?
:P
Mari,
Este texto me fez lembrar do dia em que estávamos numas das praias lá em Natal-RN tomando uma aguinnha de coco e batendo um papinho..aí chega um gringo idiota e pergunta se queríamos protetor labial,só faltou vc dizer a ele que tínhamos herpes..toma gringo idiota saiu com uma quente e duas fervendo...que nojo argh !!!
bjs,Tati
mari, creio que este não é o nosso país. apenas moramos nele.
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