Você pode sair de casa e, ao dar bom-dia para o vizinho, receber um ‘arrã’… ou simplesmente nada. Mas, se acontecer o contrário, será bem legal.
Pode ir à quadra comercial para comprar ou comer alguma coisa e dar bom-dia, boa-tarde ou boa-noite para a pessoa que irá atendê-lo. Num dia de muita sorte, ouvirá de volta o mesmo cumprimento. Num dia razoável, simplesmente um ‘bom’ ou ‘boa’ ou sua variante: ‘oa’. Num dia ruim, verá que a cara de quem está do outro lado do balcão não está lá essas coisas. Aí, ficará com vergonha de ser
Para ir à maior parte dos outros lugares além dos limites da quadra, você pegará, naturalmente, o carro. Uma vez dentro dele, você dirigirá sozinho, falará sozinho, cantará sozinho e xingará sozinho o motorista que, para variar, não deu seta nem pediu passagem (para quê, né? quase ninguém dá mesmo): simplesmente entrou na faixa de pista onde você está. Ao parar no sinal, conte quantos carros com gente solitária existem à sua volta.
Se estiver a pé, verá que é uma raridade no cenário. Se for um dia de chuva, se sentirá como o Charlie Brown, do Snoopy, ao saber que a água que escorre pela pista molhou a sua roupa… com a ajuda do ônibus que passou pertinho da não-calçada, claro.
Se tiver de frequentar bastante algum lugar (escola, faculdade, trabalho ou academia, por exemplo), é bom avisar: pode ser que algum dia você diga um ‘olá’ e fique no vácuo. Mas não é porque você falou baixo ou porque a outra pessoa está com raiva de você (afinal, ontem/num dia desses, ela conversou contigo normalmente e tudo correu bem). Ela pode só estar com preguiça de… ah, de alguma coisa aí. Dependendo do ambiente, adotar essa preguiça (ou sabe-se lá qual o nome disso) aos poucos pode virar uma estratégia de defesa. Afinal, você não vai ser o
Se for ao cinema, só se sentará ao lado de desconhecidos quando não houver mais alternativa.
Passar por tudo isso num dia só é difícil (baita azar, hein?). Mas não é raro viver aqui e experimentar cada uma dessas estranhezas em dias diferentes.
Talvez um dia você viaje e ache incrível ver os que vão à praia e tomam sol tão perto uns dos outros (e tão numa boa); aqueles que batem papo com alguém que acabaram de conhecer enquanto estão na fila do banco ou esperam os carros pararem no sinal vermelho. Mas, ao voltar à terra árida, é bem possível que toda a expansividade (re)adquirida lá fora vá murchando com o passar do tempo.
E aí, vai deixar a cidade de concreto armado embrutecê-lo? Ou vai fazer como naqueles versos e ser gentil assim mesmo?
Taí uma pergunta difícil. Numa cidade acusada (muitas vezes, com justiça) de ser fria, a resposta pode ser uma ou outra. Depende do dia.
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Na próxima terça, dia 21, aniversário de Brasília, eu posto um texto bem doce sobre a cidade, prometo.
14 comentários:
Muito bom. Vou fechar meu blogue.
coisa de cidade grande. são paulo é assim também.
recife não era, mas já não moro lá há tempo suficiente pra não saber o que anda a acontecer.
não sei se a culpa é da pressa, da internet, do sol (ou da falta dele). o fato é que as pessoas não têm mais tempo pra se relacionar.
tristeza não tem fim.
"Na próxima terça, dia 21, aniversário de Brasília, eu posto um texto bem doce sobre a cidade, prometo"
Posta sim, adoro ler textos de ficção.
(i am evil, you know)
Adorei o post. É bem assim mesmo. Por outro lado, eu achava sensacional ir aos bares de sempre e ser reconhecida pelo garçom, que me chamava pelo nome e sabia minha bebida preferida. Morri de rir uma vez que dirigia e cantava sozinha feito louca e me dei conta que o motorista ao lado estava olhando pra mim e rindo. Amo Brasília. Pode sim ser uma cidade maravilhosa! bj
RC: fecha o blog não... ainda mais agora que eu comecei a ir lá mais vezes.
Mayra: concordo com você totalmente... e saudade dos seus posts. Atualiza lá, vai. :o)
Evil: ai, que maldade... hehe. Mas já antecipo que vc há de concordar com pelo menos algumas coisas.
Paula: eu também amo Brasília, embora ela trate seus moradores tão mal às vezes! Pô, adoro ver a doideira do Beirute, o povo espalhado no Ceubinho da UnB, a galera tomando sol no Parque Olhos d'Água. Por aí você vê que a cidade não é só frieza. Mas muitas vezes ela é. Beijão!
Olá Mariana,
interessante sua percepção de Brasília. Eu me sinto do mesmo jeito, pois sou goiana e gosto muito de conversar, seja em fila ou em balcão esperando por algum atendimento.
Na semana passada estive num hospital e o atendente ao ouvir meu cumprimento de boa tarde respondeu com "O quê???" como se eu estivesse fazendo alguma ofensa.
Infelizmente falta gentileza. E isto se reflete no trânsito, que é uma floresta selvagem onde a lei do mais forte manda (eu que ando de Uno 1.0 que o diga).
Apesar destes pormenores tenho Brasília no coração. É uma cidade belíssima, onde podemos nos extasiar vendo coisas que somente os que possuem olhos alfabetizados para a beleza percebem: os ipês florescendo, o céu magnífico no final da tarde, a riqueza arquitetônica... uma cidade que merece, no mínimo nosso aplauso e nossa dedicação em fazer dela um local mais humano.
É disto que os Brasilienses estão precisando...um pouco mais de humanidade e senso de enxergar beleza nas coisas mais singelas.
Gostei muito do seu blog. Irei colocar na minha lista de favoritos.
Parabéns.
Sônia Regina
Só tá sozinha porque ainda não me conhece!!
Mari, aqui em JP tem um pouco disso também, mas não com tanta intensidade de SP ou Brasilia.
Mas sério, quero ver o lado doce. Quero muito.
A indicação ao prêmio foi SUPER merecida.
Um parabéns carinhoso
;)
* acantora fancesa Pauline, parece um pouco com a figura do selo 'esse blog é uma delícia'
rs
Sônia,
Ouvir um "O quê????" em resposta a um boa-tarde é de chorar...
Seja bem-vida ao blog, volte mais vezes! Bjos, Mari
Salut Mariana.
Oui je suis d'accord avec tout ce que tu as mis dans ton poste. Sauf que j'ai une perception un peu spatiale du problème du manque de comunication dans la ville. Je suis de ceux qui croient que les gens d'une manière générale sont influencés par l'espace de la ville où ils vivent. À Brasília, le manque d'espace public propice aux rencontres crée une certaine méfiance vis-à-vis d'autrui. D'ailleurs, si tu analyses un peu, tu trouveras que les seuls espaces où il y a communication sont les supermarchés, les centres commerciaux, les bars, les magasins, les pompes à essence...autrement dit les espaces de vente.Le commerce! Ce n'est pas anodin! La communication n'est pas gratuite!On ne parle pas avec l'autre par choix mais plutôt par intérêt. On a l'impression que les gens sont téléguidés. Sont rares ceux qui sont bien dans leurs peaux à l'extérieur en contact avec la ville. À Brasília, on sort toujours de chez-soi pour un but précis. On ne sort jamais - enfin je pense- pour ne rien faire et juste pour balader sans destination précise. Pour moi c'est un peu bizarre...le lèche-vitrine de Paris me manque beaucoup. J'espère que Brasília saura se transformer dans les années à venir en une vraie ville. C'est à dire lieu de rencontre choisi-et pas imposé- par des citoyens en toute liberté.
Estranho esta coisa de nos sentirmos sós, mesmo que com pessoas à nossa volta.
Dei por mim a sentir-me só pela segunda vez na vida (não muito longa tenho 35). Como sei que estou só? Porque pela 2ª vez dou por mim a procurar no google "Sozinho em ... (nome cidade)" e pela 2ª vez estou a por um post num blog de alguem sobre o assunto.
Sou Português e já viajei um pouco por esse mundo fora, infelizmente o "frio humano" é uma caracteristica de cidades cosmopolitas... Mas de uma maneira ou outra arranja-se um jeitinho de contornar a situação.
Brasilia! Estou cá ha 6 semanas e estou a comreçar a "aprender" a cidade, e a gostar dela. Mas Porque me sinto sozinho aqui?? É natural, sou um forasteiro que caiu aqui de paraquedas, sou Português, o que me fez ter de ouvir todas as piadas possiveis sobre os Portugas (normalmente o Manuel que abriu a panificadora), fora a parte em que muitas vezes não percebem o que digo. Passo por Italiano, Espanhol (terrivel ser confundido com essa raça), Argentino, etc...
Mas tudo faz parte de um processo de adaptação. Agora o que acho que Brasilia não tem é espaços normalmente destinados a pessoas sós, tal como Sofia (Bulgaria) o outro sitio onde me senti só. Ou seja, nas outras grandes cidades, Europa, Ásia, América etc.. Há sitios que por si só tem a caracteristica de não agrupar pessoas, não são os tipos de "bares" que existem aqui, são sitios onde normalmente a pessoa está de pé o que facilita o contacto, muito mais do que se formos a um "bar" (bar Brasileiro não Europeu, já explico a diferença) e formos obrigados a nos sentarmos sós numa mesa redonda mas que parece que tem paredes que afastam outras pessoas. Não descobri sítois que sejam "user friendly" (se me permitem o termo) para solitários.
Ora bem, "Bares", os bares Brasileiros seram tradicionalmente as casas de café ou vinho (França) Portugueses, Franceses, Espanhois e Italianos. Os Bares Europeus são uma espécie de discoteca Brasileira sem o ser. São sítios que as pessoas estam de pé, musica variada, mas que permitem o tal contacto humano que uma mesa não o faz.
No entanto, muito sinceramente, não acho as pessoas de Brasilia assim tão frias, corrijo! Fora alguns aspectos de uma clara difeerença de classes sociais muito evidente no Brasil, não sinto o receber/atender como frio, nada disso. Especialmente comparado com o Europeu. E aí surge outra dificuladade para os forasteiros que são ao mesmo tempo estrangeiros, a diferença cultural. Coisa que de certeza o brasileiro não sentirá tanto ao mudar de cidade.
Resumindo, Brasilia tem caracteristicas unicas quando comparada com outras grandes cidades, não vejo que seja mais fria ou mais dificil (tirando alguns aspectos), mas vejo sim que talvez lhe falte um "centro", tão típico das cidades que crescem sobre ele e se espandem, esse centro que aglomera pessoas e influencias. Muito organizada, muito estruturada (para o Brasil), mas muito "despersa" acho que esse é o problema, centros aproximam pessoas mesmo as sós, já em Brasilia torna-se dificil o solitário tomar a decisão de sair de casa sozinho para ir para um sitio sozinho quando se por ventura quuiser outro local para estar ter de pegar o carro e andar 20 minutos á procura nas quadras (não sei se me fiz entender).
No entanto, como é possivel não gostar desta cidade??
Estou começando a amar, um amor algo solitário, mas não deixa de ser amor.
PS: Excelente blog Mariana.
Nuno, concordo com vc. Faltam lugares destinados a pessoas sós e sítios onde todos (sós ou não) possam interagir com outras pessoas. Mas eu gosto de Brasília mesmo com esses defeitos todos que listei...
Abs e seja bem-vindo!
Acho que nao tem muito de 'doce' nesta cidade. É ate pior... moro ha 20 anos mas nao gosto. Isso aqui é uma chatice.
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